A oração da Ave-Maria, que nasceu no Ocidente entre os
séculos XIV e XV e foi difundida entre os armênios, graças ao Servo de Deus,
abade Mechitar, ainda existe na Ordem Mechitarista dos Padres Armênios, em
Veneza, e em algumas aldeias católicas armênias na Geórgia.
Padre Kevork Sarkissian, OMM
No percurso da vida há sinais indicativos, que designam o
caminho certo. Para os que pertencem à Igreja de Cristo, o próprio Deus deu uma
Mãe para guiar, ensinar e acompanhar todos ao longo de suas vidas, pois, sem
esta Mestra amorosa, o homem pode se perder. A maternidade da Virgem Maria é
uma graça indefinível para todos os cristãos que a acolhem filialmente. Em
1970, o Papa São Paulo VI, em um discurso, no santuário de Bonaria, Sardenha,
disse: “Se quisermos ser chamados cristãos, devemos ser marianos, ou seja,
devemos reconhecer a relação essencial, vital e providencial, que une a Virgem
Maria a Jesus, que nos abre o caminho que conduz a Ele”.
Do Ocidente ao Oriente
O Servo de Deus, Abade Mechitar (1676-1749), fundador da
Ordem Mechitarista e renovador do monasticismo armênio, foi um dos promotores
da devoção mariana, sobretudo, a oração do Santo Rosário, entre os povos do
mundo oriental. Assim, em 1735, publicou, em língua armênia, o Tetrak
Rosari ou Caderno do Rosário.
Mechitar, "grande entre os grandes", como o
descreveu o escritor armênio, Shavarsh Narduni, consagrou a sua Congregação à
Santíssima Virgem Maria, quando a fundou em 1700. O biógrafo de Mechitar, Padre
Stepanos Akonz, em seu livro intitulado "História da vida e obras de
Mechitar de Sebaste", define assim a identidade da sua Ordem: “Ao sair
da oração, repletos de consolação divina, unidos, uns aos outros, no Senhor e
com seu superior e, em uníssono, num só corpo e numa só alma, estiveram unidos
no serviço ao Senhor e à sua Mãe. Desde então, pela graça da Santíssima Virgem,
passaram a adotar a seguinte inscrição, como próprio sigilo, em quatro letras
iniciais: “Filhos adotivos da Virgem, Mestres (Vardapet) da
Penitência Ո․ Կ․ Վ․ Ա․,
que indicam o carisma específico da Ordem fundada por intermédio da
Bem-aventurada Virgem Maria”. A vida peregrina e os hinos do Fundador são um
bom exemplo de seu amor e devoção filial mariana.
A visão da Virgem
Esta materna proteção começara já em 1692, quando Mechitar,
ainda jovem diácono, estava no mosteiro de Sevan, Armênia, onde recebera o dom
de uma visão da Virgem Maria, que lhe perguntou: "O que você quer,
Mechitar?" E ele respondeu: "O que a Senhora quiser". E a Mãe
acrescentou: "Assim seja". Eis o ponto central da devoção mariana de
Mechitar, como explica o Padre Stepanos Akonz: “Desde então, a imagem
maravilhosa desta visão jamais se dissipou em sua mente e sempre a tinha diante
dos olhos da mente em todas as suas orações. Para ele, esta imagem sempre foi
também uma consolação diante de todos os sofrimentos e tribulações, pelos quais
passou em sua vida”. Mas, o carisma e o coração do pensamento e da vida de
Mechitar sempre foram cristocêntricos, como ele mesmo explica em seu testamento
espiritual, na introdução do Dicionário armênio: “Desde o
início, a minha missão e a da nossa Congregação sempre foi estar a serviço do
povo armênio e da glória de Cristo nosso Deus, bendito para sempre”.
Maria, presente "sempre e em todo lugar"
Assim, Mechitar mantinha a Virgem Maria presente sempre e em
todo lugar. Ele ensinou aos seus seguidores a Oração da Ave-Maria,
que aprendera, ainda criança, com dois monges do eremitério de Lim, uma ilha no
Lago Van, hoje na Turquia. Como escreve o Padre Torossian, os dois eremitas
deixaram "nada mais que os exemplos de virtude e o bom costume de rezar,
todos os dias, esta Saudação angélica”. Desde então, a piedade
mariana passou de Mechitar aos Mechitaristas e, através deles, de seu exemplo
constante e da publicação de seus textos, difundiu-se entre o povo, até os dias
de hoje.
A antiquíssima devoção das “Mil Ave-Marias” nasceu no
Ocidente, entre os séculos XIV e XV. Segundo a tradição, na noite de Natal de
1445, enquanto Santa Catarina de Bolonha recitava as Mil Ave-Marias,
recebeu a aparição da Virgem Maria com o Menino Jesus, que lhe concedeu a graça
de segurar o Menino Jesus em seus braços, por quinze minutos. Esta devoção
mariana de rezar “Mil Ave-Marias” continuou com as Filhas da Santa, no Mosteiro
de Corpus Christi, até certo ponto da história.
Uma devoção que continua
Hoje, esta devoção mariana continua ainda entre os Padres
Mechitaristas e em algumas aldeias católicas armênias na Geórgia. A tradição
local da aldeia é a seguinte: “Todas as famílias, das crianças aos idosos,
reúnem-se e se ajoelham e rezam esta piedosa oração, sobretudo, em preparação
ao Santo Natal. A família, que os Padres do Concílio Vaticano II chamam
"igreja doméstica", ainda existe no Extremo Oriente”. Este Rosário
meditativo-afetivo, sensível e materno, destaca quatro características de
Maria: Mãe, dar à luz, amamentar e beijar seu Filho. Desta forma, Jesus, na
totalidade do amor materno de Maria, é envolvido pelo abraço, nutrido com leite
puro e, por fim, acariciado com seu santo beijo.
As dezenas do Rosário
O Santo Rosário tem início no dia 29 de novembro e termina
com as “Mil Ave-Marias” em 23 de dezembro, ou seja, durante todo o
período de Advento. No entanto, em 24 de dezembro, véspera de Natal, são
contemplados os Mistérios Gozosos. A oração mariana divide-se em 25 dias: 40
Ave-Marias em cada dia, com um acréscimo especial para cada dezena. Na
tradição armênia, este número de Ave-Marias também é chamado
“Rosário de Ouro”, que os fiéis recitam, até hoje, nas festas marianas, ao
longo do Ano litúrgico.
Para cada dezena, acrescenta-se, a cada Ave Maria,
um suplemento na seguinte ordem:
Primeira dezena: “Bendita a hora, ó Virgem Maria, em que
vos tornastes Mãe de Deus” (10 Ave-Marias).
Segunda dezena: “Bendita a hora, ó Virgem Maria, em que
deste à luz o Filho de Deus” (10 Ave-Marias).
Terceira dezena: “Bendita a primeira gota de leite, ó
Virgem Maria, com a qual o Filho de Deus se alimentou em vosso ventre” (10
Ave-Marias).
Quarta dezena: “Bendito aquele primeiro beijo, ó Virgem
Maria, que destes nos divinos lábios do Filho de Deus” (10 Ave-Marias).
Na véspera de Natal, após a reza dos Mistérios Gozosos do
Santo Rosário, a corrente dourada da piedosa tradição conclui-se com uma oração
dedicada à Santíssima Virgem Maria.
Oração da família e pela família
Aqui, o convite a todas as famílias cristãs de rezar esta
humilde, bela e simbólica devoção mariana, repleta de espiritualidade e afeto.
Como o Papa São João Paulo II disse em sua Carta apostólica “Rosarium
Virginis Mariae”: “O Rosário é uma oração da família e pela família”.
Devemos ser educados e formados na sensibilidade materna de Maria, "a
mulher da perfeita alegria". Que ela interceda por nós e peça ao seu Filho
Jesus que nos conceda um coração de escuta, oração, paz e comunhão.

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