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quinta-feira, 13 de novembro de 2025

Sei que te alegrou muito, Jesus. As coisas pequenas (Parte 2/2)

Cuidar das coisas pequenas (Opus Dei)

Sei que te alegrou muito, Jesus. As coisas pequenas

São Josemaria nos ensinou a cuidar das coisas pequenas porque compreendia a capacidade do homem de agradar a Deus com pequenos e quase minúsculos detalhes realizados por amor.

Os “detalhes caseiros do herói”

Olhar para a imensidão do amor de Deus, que nos ama com loucura, pode ajudar-nos a compreender o valor que as pequenas coisas têm para Deus, precisamente porque são nossas. Temos consciência de que nunca pagaremos a dívida, mas entusiasma-nos sonhar em contribuir para sustentar as despesas familiares. É o seu amor que transforma as nossas quinquilharias em joias preciosas. Tudo serve para tornar feliz a Deus: bastam, como nos diz o Evangelho, duas moedas que formam a quarta parte do ás, mas que Deus considera aptas para a sua infinita capacidade de amar e ser amado. Estas coisas pequenas libertam a alma porque a ajudam a deixar-se amar a troco de nada. Vividas assim, não sufocam. Pelo contrário, não é possível estar atento a com perseverança se forem fruto do anseio de controlar, de pagar a dívida. Trata-se, na verdade, de detalhes espontâneos e simples de quem se sabe olhado com carinho por um Deus todo-poderoso e eterno, mas, ao mesmo tempo, um Deus muito caseiro.

Muitos de nós não teremos a categoria dos grandes santos ou dos mártires, teremos, porém, a sorte de que nossos atos cativem a Deus. Nunca pensaremos que fazemos algo que mereça o seu carinho e é precisamente isso que abre plenamente o nosso coração à sua graça. Ele se deleita com a nossa luta gratuita, livre e alegre. Como não percebemos a altura, não temos vertigem e atuamos com uma naturalidade e uma fé encantadoras para ele: “Muito bem, servo bom e fiel; já que foste fiel no pouco, eu te confiarei muito; vem regozijar-te com teu senhor” (Mt 25, 23).

Penetrar, com esta perspectiva, no universo das coisas pequenas permite-nos evitar duas caricaturas que não são dignas do humor e do amor com que Deus nos olha. Aparentemente distantes um do outro, os dois desvios têm algo decisivo em comum: colocam o foco em nós, no que fazemos. Por um lado, podemos descobrir depois de anos de luta que o cuidado das coisas pequenas nos proporciona certa segurança e corremos o risco de buscar nelas a tranquilidade de quem se limita a cumprir. Sem perceber, talvez, transformaram-se em atos rígidos que servem de analgésico para a nossa insegurança. Nós as vivemos externamente, mas não desfrutamos delas. Por outro lado, pode acontecer também que representem para nós um peso insuportável, uma carga que oprime e desfoca o rosto amável de Cristo porque tornam a luta aflitiva para nós.

OLHAR PARA A IMENSIDÃO DO AMOR DE DEUS, QUE NOS AMA COM LOUCURA, PODE AJUDAR-NOS A COMPREENDER O VALOR QUE AS PEQUENAS COISAS TÊM PARA DEUS

De qualquer forma, a solução não está em não lhes dar atenção. Trata-se antes de observar como é a nossa luta diante de Deus, e não os resultados que tenhamos obtido. É questão de voltar a ater-nos a ele. Essa luta pode ser muitas vezes escondida, ínfima e sem fruto, mas é parte do “eterno diálogo entre a criança inocente e o pai, doido por seu filho: – Quanto me queres?... Fala! – E o garotinho diz, marcando as sílabas: – Mui-tos mi-lhões!”[10].

São Josemaria escreve sobre isso em uma carta: “Que tolices te conto! É verdade: mas tudo em que intervimos os pobrezinhos dos homens – até a santidade – é um tecido de pequenas miudezas que, corretamente retificadas, podem formar uma tapeçaria esplêndida de heroísmo ou de baixeza, de virtudes ou de pecados. As gestas – o nosso Mio Cid – relatam sempre aventuras gigantescas, mas misturadas com detalhes caseiros do herói. – Oxalá dês sempre muita importância – é a linha reta! – às coisas pequenas. E eu também; e eu também [...]”[11].

A graça nos torna ágeis

Enlouquecer a Deus é possível em Cristo. Os nossos pequenos esforços – as nossas moedinhas – unidos a Cristo, transformados em sua própria oferenda, convertem-se em um “sacrifício puro, imaculado e santo” (Oração Eucarística I); constituem um dom agradável a Deus Pai, como diz o sacerdote em voz baixa uma vez apresentadas as oferendas na Santa Missa. A expressão latina é muito significativa: “Ut placeat tibi” para que te compraza. Produzem esse efeito porque a Eucaristia “nos faz penetrar no ato oblativo de Jesus”[12].

Os santos encontraram um trampolim para estar à altura; descobriram que inclusive os nossos defeitos ajudam-nos a amar mais a nosso Senhor se, arrependidos, os colocarmos em suas mãos: “Repito-lhe que o amo, e depois encho-me de vergonha, porque, como posso assegurar que lhe quero bem, se tantas vezes eu o ofendi? A reação então não é pensar que minto, porque não é verdade. Continuo a minha oração: Senhor, quero desagravar-te pelo que te ofendi e pelo que te ofenderam todas as almas. Repararei com a única coisa que posso oferecer-te: os méritos infinitos do teu Nascimento, da tua Vida, da tua Paixão, da tua Morte e da tua Ressurreição gloriosa; os da tua Mãe e os de São José; as virtudes dos Santos e as fraquezas de meus filhos e as minhas, que reverberam de luz celestial – como joias – quando detestamos com todas as forças de nossa alma o pecado mortal e o pecado venial deliberado[13]. A alma que se deixa amar, apropria-se dos méritos de Cristo e se sente capaz de alcançar cumes, que, para as suas forças, seriam inatingíveis. Tanta audácia – impulsionada pela graça de Deus – pode ser inclusive paradoxal, divertida, faz-nos rir. E este bom humor estimula a nossa melhor resposta a esse amor que nos é presenteado.

“SENHOR, QUERO DESAGRAVAR-TE PELO QUE TE OFENDI E PELO QUE TE OFENDERAM TODAS AS ALMAS” (SÃO JOSEMARIA)

Neste sentido, Bento XVI confiava numa entrevista uma intuição muito pessoal sobre como é Deus: “Pessoalmente creio que Ele tem um grande senso de humor. Às vezes dá a uma pessoa um empurrão e diz: ‘Não te dês tanta importância!’. Na realidade, o humor é um componente da alegria da criação. Em muitas questões de nossa vida nota-se que Deus também nos quer impulsionar a ser um pouco mais leves; a perceber a alegria; a descer de nosso pedestal e a não esquecer o gosto pelo que é divertido”[14].

Deus quer que entremos em sua alegria (Mt 25, 23), que participemos da sua alegria íntima, do seu gozo infinito que nada pode destruir. Para isso nos criou[15].

Possivelmente, a boa mulher do evangelho não perdeu muito tempo pensando se sua oferenda é maior ou menor do que a dos outros que iam ao gazofilácio. Teve a intuição de que Deus não se importava muito com a quantidade. Não foram necessários muitos cálculos e nem fez comparações. Pareceu-lhe simplesmente lógico dar tudo. Não fez drama da sua pobreza, embora talvez a sua condição não fosse das melhores. É assim que vivem e entendem os santos. São audazes e espirituosos, divertidos e engraçados: “Estou muito contente de ir logo ao céu. Mas quando penso naquelas palavras do Senhor: ‘Trago comigo meu salário, para pagar a cada um segundo suas obras’, digo a mim mesma que no meu caso Deus vai se ver em apuros: Eu não tenho obras! De modo que não poderá pagar-me ‘segundo minhas obras’ ...Pois bem, pagar-me-á ‘segundo as d’Ele’...”[16].

O profeta Sofonias narra o que Deus pensa e sente por seus filhos: “O Senhor, teu Deus, está no meio de ti como herói Salvador! Ele anda em transportes de alegria por causa de ti, e ele te renova seu amor. Ele exulta de alegria a teu respeito como em um dia de festa” (So 3, 16-18). O Papa contou que essas palavras o impactaram sempre: “Enche-me de vida reler este texto”[17]. São palavras que a Igreja aplica também à Mãe de Deus. A Virgem pode explicar-nos como chegar a esta convicção, já que ela nunca duvidou de que Gabriel dizia-lhe a verdade: “Achaste graça diante de Deus” (Lc 1,30); tornaste o teu Criador louco.

Diego Zalbidea


[10] São Josemaria, Caminho, n. 897.

[11] Carta de Josemaria Escrivá a Juan Jiménez Vargas, Burgos 27-III-1938. Citado em Pedro Rodríguez, Caminho. Edição Comentada, Quadrante, São Paulo, 2014, p. 826.

[12] Bento XVI, Encíclica Deus caritas est, n. 13.

[13] São Josemaria, En diálogo con el Señor, “La alegria de servir a Dios”, 25/12/1973, n. 4a.

[14] Bento XVI, Dios y el mundo , Círculo de Lectores, Barcelona, 2005, p. 13.

[15] Cfr. Catecismo da Igreja Católica, n.1.

[16] Santa Terezinha do Menino Jesus, Carta 226.

[17] Francisco, Ex. ap. Evangelii Gaudium, n. 4.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/sei-que-te-alegrou-jesus/

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Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF