No Ano Santo da Esperança, a história de Alessio D’Aniello,
nascido no Brasil e hoje cantor no coral Pontifício da Capela Sistina, ilumina
o projeto Hands for Adoptions, inaugurado em Roma para apoiar famílias e filhos
adotivos na busca pelas próprias origens.
Thulio Fonseca – Vatican News
Há histórias que nascem pequenas e silenciosas, mas que, com
o passar do tempo, se transformam em pontes sólidas entre culturas, gerações e
corações. Histórias assim são sementes de esperança. É nesse horizonte que se
insere o Espaço de Escuta e Palavra “Hands for Adoptions”, recém-inaugurado no
Instituto Casa Helena, em Roma, em colaboração com o CAF Internacional.
O novo ambiente oferece acolhida a famílias adotivas, jovens
e adultos que buscam suas origens, abrindo um caminho de escuta, orientação e
serenidade. Ali, cada pessoa é recebida não apenas em suas necessidades
práticas, mas na integralidade de sua história, com suas fragilidades,
perguntas e possibilidades de renascimento.
De Araxá ao serviço na Capela Sistina
Entre as histórias que dão vida ao projeto, destaca-se a de
Alessio D’Aniello, cantor da Capela Musical Pontifícia Sistina há mais de doze
anos. Nascido em Araxá, no Brasil, e adotado ainda bebê por uma família da
província de Nápoles através das Irmãs Discípulas de Jesus Eucarístico, Alessio
cresceu respirando valores que moldaram sua identidade: família, fé, respeito,
disciplina e sensibilidade humana.
Foi na Itália que sua vocação musical floresceu. Formado
pelo Conservatório “San Pietro a Majella”, em Nápoles, e após diversas
experiências artísticas, o cantor encontrou sua missão maior na liturgia.
“Cantar para mim é servir com amor. É doar aquilo que recebi”, afirma. Sua voz,
que acompanha as celebrações do Santo Padre, tornou-se para ele não apenas
expressão artística, mas oração e gratidão.
A busca pelas origens e o encontro que cura
Apesar do amor recebido em casa, a adolescência de Alessio
trouxe perguntas que marcam a vida de muitos filhos adotivos: quem sou? De onde
vim? Qual é o rosto do meu primeiro capítulo? Essas questões, inicialmente
silenciosas, tornaram-se mais profundas com o tempo, até que, já adulto, ele
decidiu retornar ao Brasil para buscar sua mãe biológica. O reencontro
tornou-se um marco decisivo. “Ela curou a dor de ter me deixado partir; eu
preenchi o vazio de não conhecer meu início”, recorda. Para ele, buscar as origens
não é um ato de ruptura, mas um gesto de reconciliação com a própria história:
“Não significa amar menos os
pais que me criaram. É acolher toda a verdade que me pertence.”
Três histórias que se encontram e dão origem a um projeto
O Hands for Adoptions nasceu da união de três trajetórias
adotivas: a de Paolo La Francesca, policial do Estado, nascido no Brasil e
criado na Sicília, que reencontrou a mãe após longa procura; a de Livio Donato,
romeno e ex-jogador profissional, adotado por uma família italiana; e a de
Alessio D’Aniello, cuja caminhada espiritual e humana o conduziu a olhar para
suas raízes com profundidade:
“Na adolescência, meus pais sempre me contaram sobre a
viagem que fizeram ao Brasil; sempre soube que tinha sido adotado, mas, à
medida que crescia, precisei enfrentar perguntas, feridas, silêncios e o
desejo, cada vez maior, de buscar minhas origens. Ao chegar à maioridade, esse
desejo transformou-se em uma motivação mais profunda: agradecer à mulher que me
trouxe ao mundo e que, com sua escolha, me deu a possibilidade de uma vida
melhor. A mão de Deus, depois de alguns anos e por meio de sinais inequívocos,
conduziu-me ao Brasil, aos seus braços. Naquele encontro, e nos seguintes, pude
conhecer sua história: uma história triste, mas corajosa; a adoção era a única
forma que ela tinha para me oferecer um futuro. Deixar-me partir foi, para ela,
o maior ato de amor. A fé foi sua âncora de salvação durante os sofrimentos, a
força que lhe permitiu seguir adiante. O encontro com minha mãe biológica
certamente fechou um ciclo importante em minha vida; hoje consigo enfrentar os
desafios com uma perspectiva diferente. O reencontro com ela curou duas
feridas: a dela, por ter me deixado partir, e a minha, ao preencher um grande
vazio.”
A partir de suas experiências pessoais, os três fundadores
entenderam que muitas famílias passam por desafios intensos após o processo
jurídico da adoção: dúvidas, silêncios, conflitos, buscas identitárias.
Perceberam que também os jovens e adultos adotados necessitam de acompanhamento
para enfrentar questões que nem sempre encontram espaço na rotina familiar.
Assim nasceu um projeto que deseja caminhar junto com aqueles que vivem a
beleza e, por vezes, a delicadeza do universo adotivo.
Uma rede de apoio intercultural e solidária
O espaço conta com uma rede que une competência técnica e
sensibilidade humana. O CAF Internacional, dirigido pelos brasileiros Fabiana
Santos e Antonio Libanio, tornou-se referência para migrantes em Roma,
oferecendo orientação burocrática e apoio humano para estrangeiros em fase de
integração. Já o Instituto Casa Helena, dirigido pela psicóloga Lilia Azevedo,
especializada em abordagens interculturais e plurilíngues, oferece acolhimento
psicológico e educativo a famílias e filhos em diferentes fases da adoção. Essa
colaboração cria um ambiente seguro, onde cada história pode ser acolhida sem
pressa, e onde a palavra, tantas vezes ausente, encontra novamente o seu
espaço.
Uma casa afetiva para quem busca sua verdade
Hands for Adoptions se diferencia por colocar no centro não
apenas a adoção como ato jurídico, mas como caminho humano, relacional e
espiritual. O espaço busca ser “uma casa afetiva”, onde famílias e filhos
adotivos possam partilhar suas vivências sem temor, encontrando escuta, apoio e
orientação. A proposta é criar pontes entre culturas e gerações, trabalhar a
reconstrução das histórias pessoais e ajudar cada pessoa a trilhar seu próprio
percurso com serenidade. Para Alessio, esse processo é fundamental:
“Dar um rosto ao início da
própria história não é uma afronta aos pais adotivos. É um ato de amor consigo
mesmo e com quem nos deu a vida.”
Convite à esperança
Neste Ano Santo da Esperança, o projeto deseja ser um sinal
concreto de acolhimento e acompanhamento. Para famílias que aguardam a adoção,
Alessio deixa uma palavra de encorajamento: “Não se deixem desanimar pelas
longas esperas. Há muitas crianças que sonham com uma família.” Para quem já
vive a realidade adotiva, ele recorda que a verdade é um gesto de amor que
fortalece o vínculo e ajuda o filho a crescer de modo mais sereno e seguro. E
aos jovens e adultos adotados, deixa um convite à coragem: “Buscar as origens é
direito e também caminho de libertação interior.”
A vida de Alessio D’Aniello se transformou em testemunho de
fé e esperança. Hoje, sua voz ressoa nas celebrações do Santo Padre; e, ao
mesmo tempo, ecoa na experiência de tantas famílias e jovens que procuram
compreender sua própria história. Uma voz que une Brasil, Itália e Vaticano.
Uma voz que se faz ponte de esperança.





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