Por Marcos Koboldt
19 de nov de 2025 às 12:52
A falta de vocações levou a arquidiocese de Porto Alegre à
decisão de fechar o Seminário São José. Inaugurado em 1938, o seminário serviu
de residência e escola para muitos padres e bispos quando estavam em seu
processo de formação, especialmente no ensino médio e a etapa do propedêutico.
No início deste semestre, os últimos residentes - cinco seminaristas da etapa
do propedêutico, ano inicial de transição para o seminário maior - foram
transferidos para Porto Alegre.
Segundo o bispo-auxiliar da Arquidiocese de Porto Alegre dom
Juarez Albino Destro, a decisão foi tomada para oferecer aos jovens um local
mais apropriado. “A ala onde funcionava, de fato, o seminário deve ser
reformada”, explica Dom Juarez.
O Seminário São José dividia o espaço com a Casa de Retiros,
local destinado para receber encontros, palestras, retiros e eventos. “Na época
em que se reformou o prédio para ser casa de encontros, retiros, eventos,
deixou-se a ala de habitação dos seminaristas para ser reformada com as
entradas provenientes da casa de encontros - valores com a locação seriam
revertidos para a reforma daquela ala. Desta forma, o plano é reformar a ala do
seminário que ainda não foi reformada, completando-se a inteira e possibilitando
novamente ser habitada. O que falta definir é o futuro do prédio, podendo
continuar inteiramente dedicado a receber retiros e eventos ou se irá reservar
um espaço para os seminaristas”, completa o bispo auxiliar de Porto Alegre.
Tristeza com a saída do seminário e menos vocacionados
A decisão de transferir os últimos seminaristas de
Gravataí para Porto Alegre provocou tristeza em ex-alunos que passaram pelo
local. É o caso do jornalista Rodrigo Jankosi, 40 anos, que fez a etapa do
Propedêutico no ano de 2009.
“Fui forjado nas Pastorais Sociais da Igreja Católica.
Foi ali que despertou em mim o interesse pela vida religiosa. O processo de
discernimento vocacional durou cerca de cinco anos, até que cheguei ao
Seminário São José, em Gravataí, para cursar o propedêutico. Ali se abria uma
nova janela de conhecimentos e vivências que levo comigo para toda a vida. Ao
saber da saída dos últimos seminaristas das dependências do seminário, um
sentimento estranho me tomou. Penso que as novas gerações de vocacionados talvez
não tenham a oportunidade de viver as experiências que aquele espaço mágico nos
proporcionava. Rezo para que a Arquidiocese não se renda, mais uma vez, à
especulação imobiliária e não permita que aquele lugar sagrado seja entregue às
incorporadoras”, declarou Jankosi.
Também ex-aluno do Propedêutico no Seminário São José, o
professor e músico João Fernando Schafer de Brum, 40 anos, ingressou no ano de
2005 quando estava no primeiro ano do Ensino Médio e fez o propedêutico três
anos depois. Em sua avaliação não há sentido em manter um grupo pequeno de
seminaristas em um local tão grande como o Seminário. “Quando fiz o Ensino
Médio, moravam na casa mais de 50 seminaristas das duas etapas. Alguns anos
depois retornei para ministrar aulas de música e o número já era bem menor. Se
couber uma crítica penso que o trabalho de animação vocacional caiu demais.
Entendo que com a internet as coisas se complicaram, mas há pouco empenho em
buscar novas vocações. Muitas vezes podemos perder bons candidatos pois eles
não sabem como é a rotina do Seminário”, ponderou Schaefer.
Seminário são José e a cidade de Gravataí
A história do Seminário são José é uma parte essencial da
identidade histórica e cultural da cidade de Gravataí. A ideia de sua fundação
surgiu no contexto de expansão da vida religiosa no Rio Grande do Sul durante a
década de 1930. As obras tiveram início em 1936, com ampla mobilização da
comunidade católica local, e seguiram em ritmo constante até março de 1938,
quando o seminário foi solenemente inaugurado. A data escolhida, 19 de março de
1938, coincidia com a festa litúrgica de São José e com o jubileu de 25 anos de
episcopado de dom João Becker, arcebispo de Porto Alegre entre os anos de 1912
e 1946.
Até o ano de 1950, a administração e a formação dos
seminaristas estavam sob a responsabilidade da Companhia de Jesus. Após o
encerramento do contrato com os Jesuítas, a arquidiocese de Porto Alegre
assumiu diretamente a condução da instituição, dando continuidade à formação de
seminaristas do clero secular. Nesta época, o Seminário São José ocupava
uma área de 300 hectares - hoje o total é de aproximadamente 10 hectares.
Em 1967, acompanhando as transformações pedagógicas e
eclesiais do período pós-Concílio Vaticano II, o seminário passou a se chamar
Escola Vocacional São José, incorporando também leigos e religiosos ao corpo
docente. A nomenclatura e o currículo foram adaptados ao ensino de primeiro e
segundo grau. O funcionamento da instituição era sustentado por diferentes
fontes: a produção agrícola da granja do Seminário, as contribuições dos pais
dos alunos e o apoio constante da Mitra Arquidiocesana, além da generosidade de
benfeitores conscientes da importância das vocações religiosas.
Nesse mesmo período, parte das turmas foi transferida
para o Seminário São João Vianney, na cidade de Bom Princípio, distante 60
quilômetros da capital Porto Alegre, e criou-se o Curso de Aperfeiçoamento,
voltado a preparar melhor os seminaristas para os estudos superiores de
Filosofia e Teologia.
Segundo registros históricos, até 1985 passaram pelo
Seminário 2.936 alunos, dos quais 285 foram ordenados padres e vários
tornaram-se bispos. Em 1986, por exemplo, o Seminário de Gravataí contava com
41 alunos na 7ª série, 19 na 8ª série e 22 no curso de aperfeiçoamento.
O administrador Pedro Stein, 48 anos, passou pelo Seminário
São José neste período. Aos 12 anos, em 1989, ingressou para estudar na sétima
série. Ele conta que o testemunho de seu pároco foi decisivo para dar uma
resposta ao que Deus inspirava em seu coração.
“O tempo que passei no Seminário São José de Gravataí foi
muito importante para a minha fé. Lá eu aprendi a rezar melhor, a conhecer mais
sobre Jesus e a viver com outras pessoas que também queriam seguir a Deus. Tudo
o que vivi lá me ajudou a ser uma pessoa melhor e mais próxima de Jesus, e eu
vou guardar pra sempre tudo o que aprendi nesse tempo tão especial”.
Morador de Gravataí, o professor de história e pesquisador
Amon da Costa recorda que o trabalho formativo realizado no interior dos muros
do Seminário São José trouxe benefícios para toda a cidade. “Mais do que um
centro de formação sacerdotal, o Seminário São José consolidou-se como espaço
de educação, cultura e espiritualidade que marcou profundamente a história
social e religiosa de Gravataí. Seus muros testemunharam não apenas a formação
de padres e bispos, mas também de líderes comunitários, professores,
missionários e cidadãos comprometidos com o bem comum e com a fé cristã”.
*Jornalista formado pela Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul no ano de 2004. Entre 2004 e 2014 trabalhou como repórter em
diferentes empresas de comunicação de Porto Alegre. Entre os anos de 2022 e
2024 foi Assessor de Comunicação da Arquidiocese de Porto Alegre.

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