Por Natalia Zimbrão
2 de nov de 2025 às 07:30
A Igreja Católica comemora hoje (2), da de finados, todos os
fiéis defuntos. Rezar e celebrar missas por quem já morreu é uma tradição da
Igreja. Na missa pelos mortos, o fiel “deve buscar acima de tudo a salvação da
alma do fiel falecido” e, “com confiança, entregar aquela alma à misericórdia
de Deus, suplicar o perdão dos seus pecados, o alívio das penas devidas às suas
faltas”, disse à ACI Digital, em 2023, o padre Anderson Alves, da diocese de
Petrópolis (RJ). Portanto, não se trata apenas de agradecer pela vida da
pessoa que morreu ou consolar os entes queridos que ficaram.
“Quem o faz com fé, já tem o consolo da mesma fé. Os
sacerdotes buscam, nesse momento, fortalecer a fé pascal dos fiéis. Certamente
podem agradecer a Deus pelas boas obras do fiel. Mas devem também suplicar o
perdão das suas falhas e pecados, confiantes na misericórdia divina”,
acrescentou o sacerdote, que é diretor espiritual do seminário diocesano Nossa
Senhora do Amor Divino e professor de Filosofia e Teologia Moral na
Universidade Católica de Petrópolis (UCP).
O padre Alves destacou que “a Igreja é um mistério de
comunhão” e a missa pelos mortos “pretende fortalecer a comunhão”, pois, por
ela, “os falecidos necessitados de purificação são auxiliados; e os seus amigos
e parentes vivos são confortados, são fortalecidos na fé no mistério pascal de
Cristo, que ilumina o mistério da morte do cristão”. “O cristão acredita nas
palavras de Jesus: ‘Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim,
ainda que morra, viverá; e quem vive e crê em mim, não morrerá eternamente’ (Jo
11, 25-26). A vitória de Cristo sobre a morte é o início da vida eterna do
cristão”, acrescentou.
Segundo o sacerdote, rezar pelos mortos “supõe,
evidentemente, a crença católica no juízo particular, que ocorre logo após a
morte do fiel”. “A morte é a separação de corpo e alma. O corpo vai para o
sepulcro e a alma sobrevive, por graça de Deus, independentemente do corpo.
Essa alma é julgada pela verdade divina. As almas que estiverem na perfeição da
caridade, alcançam imediatamente a comunhão com Deus, chamado então de Céu. As
que morrerem com uma caridade imperfeita, ou seja, com alguns apegos ao pecado
e às realidades terrestres, precisarão de uma última purificação, num estágio
chamado então de ‘purgatório’. As nossas orações e o sacrifício da missa ajudam
a purificar esses nossos irmãos”, disse.
O Catecismo da Igreja Católica diz em seu parágrafo 1.051
que, “ao morrer: cada homem recebe, na sua alma imortal, a sua retribuição
eterna, num juízo particular feito por Cristo, Juiz dos vivos e dos mortos”.
Portanto, disse o padre Alves, “é melhor evitar a afirmação de que o fiel
falecido ‘já está no céu’”.
Para ele, pode ser que quem faça esta afirmação tenha “o
intuito de consolar maior do que o de recordar a doutrina completa da Igreja”.
“Talvez esteja movido pelos sentimentos da ocasião, ou talvez não tenha
recebido um conhecimento exato da doutrina católica. A Escatologia é uma
disciplina teológica que estuda esses temas e foi muito descuidada nos últimos
anos, infelizmente, nas faculdades e seminários católicos”, disse.
O sacerdote destacou que “só podemos dizer” que o morto “já
está no céu” em relação aos “santos canonizados pela Igreja”. “É certo que no
início da Igreja, por um período, o santo era declarado como tal por aclamação
popular. E um fiel pode ter a convicção de que algum falecido já esteja no céu.
Muitos tiveram essa crença, por exemplo, durante o funeral de João Paulo II e
Bento XVI e declaravam ‘santo súbito’. Mas só podemos ter a certeza de que um
irmão esteja mesmo no Céu quando a Igreja declara a sua santidade, após um
processo de canonização, algo que já ocorreu com João Paulo II e esperamos
ocorrer logo com Bento XVI”, disse.
O padre Anderson Alves disse ainda que “é fato que a alma
não perde a sua memória, não fica adormecida, sem consciência”. Por isso, “se
um fiel falece em santidade”, ele “pode encontrar-se com outros santos,
inclusive seus parentes, no Céu”; e, “se falece e vai para o purgatório, pode
se recordar de outros fiéis vivos e falecidos”.
“O fato é que nós esperamos que todos se salvem, embora
saibamos por fé que nem todos se salvem. A Igreja nos dá a certeza dos santos,
mas não tem um catálogo dos condenados. Podemos esperar, portanto, encontrar
nossos parentes e falecidos no céu e, enquanto vivemos, podemos rezar por isso
e trabalhar pela salvação deles, para que esse desejo se realize. Se será
realizado, só Deus o sabe”, disse.
Falta uma catequese sobre a morte
Para o padre Anderson Alves, atualmente, “falta uma
catequese, uma meditação, uma reflexão maior sobre o tema dos chamados
novíssimos (que falam das realidades últimas): a morte, o juízo particular, o
inferno, o céu e o purgatório”.
“Infelizmente o discurso eclesial se secularizou muito nos
últimos anos; tendemos a falar de política, de questões sociais, de meio
ambiente, de violências, ofensas e mortes, de tantos temas nas nossas
assembleias, que praticamente nos esquecemos de falar da nossa maior certeza:
que todos morreremos um dia”, disse.
Ele lembrou que, “depois da morte, seremos julgados e
receberemos o que tivermos buscado na nossa vida: uma vida eterna com Deus, um
uma vida eterna sem Deus”. “Não há meio termo, esses são os dois únicos
destinos eternos do homem”, porque “o purgatório é um estado provisório”,
ressaltou.
“A cada momento, em cada ato humano, escolhemos livremente o
nosso destino eterno. Isso não deve nos aterrorizar, mas deve nos tornar muito
conscientes, muito responsáveis e zelosos para com o nosso tempo, com a nossa
alma, com a caridade, que cobre uma multidão de pecados”, declarou.
O padre recordou as palavras de santo Tomás de Aquino, que
definiu o pecado como “‘aversio a Deo et conversio ad creaturas’ (aversão
a Deus e conversão às criaturas)”. “Em cada ato humano estamos escolhendo: se
nos convertemos a Deus ou às criaturas. E como não podemos servir a dois
senhores, se nos convertemos a Deus, não teremos criaturas como o nosso fim
último. Se nos convertemos às criaturas e abandonamos a Deus, corremos o risco
de nos perdermos para sempre. Devemos então nos recordar das palavras de Jesus:
‘O que adiante um homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?’ (Mc 8,
36)”, disse.
Respondendo se a Igreja mudou sua posição sobre a morte e
passou a valorizar mais a manutenção e a promoção da vida do que a preparação
para a vida eterna, o padre disse que não. “Pode ter ocorrido certa mudança
circunstancial no discurso eclesial, como citei anteriormente, que pode dar a
entender tal mudança. Mas não é possível manter a vida para sempre. Nossa maior
certeza, é que somos mortais, que o nosso tempo está se esgotando, que o mais
importante é decidirmos por Deus, afastando-nos do amor idolátrico pelas
criaturas”.
“Evidentemente, o homem é composto de corpo e alma e temos o
dever moral de cuidar do nosso corpo e da nossa alma. Devemos buscar cuidar da
nossa vida, da nossa saúde, para podermos servir a Deus por muitos anos sobre
essa vida, colaborando com a salvação de muitos. Também devemos ter caridade e
cuidar da vida dos nossos irmãos”, disse.
Ao mesmo tempo, destacou o padre, “o nosso grande desejo
deve ser o de ver a Deus, com o nosso corpo”. “A Igreja não poderá jamais
deixar de promover a vida da alma. Como santo Tomás de Aquino dizia, seguindo
santo Agostinho: ‘Como a alma é a vida do corpo, a caridade é a vida da alma’.
E disse também são João da Cruz: ‘Ao entardecer da vida, seremos julgados pelo
amor’. É isso o único que realmente conta”, concluiu.
*Natalia Zimbrão é formada em Jornalismo pela
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. É jornalista da ACI Digital desde
2015. Tem experiência anterior em revista, rádio e jornalismo on-line.

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