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quarta-feira, 17 de setembro de 2025

“Semeaduras”: ações de ecologia integral da Arquidiocese de Manaus

Ações de ecologia integral (Vatican News)

No coração da maior e mais importante floresta do mundo, a Amazônia, a Assembleia Sinodal Arquidiocesana assumiu a missão de cuidar da casa comum desde 2022. A Comissão para a Ecologia Integral encoraja esse cuidado com a criação em todos os espaços: doméstico, laboral, comunitário e eclesial. O documento “Semeaduras” traz exemplos práticos e também a atuação dos educadores ambientais.

Pe. Luis Miguel Modino*

A ecologia integral e o chamado ao cuidado da casa comum pode ser considerado um dos grandes legados do Papa Francisco, um caminho que continua sendo trilhado pelo Papa Leão XIV. Na Arquidiocese de Manaus, no coração da maior e mais importante floresta do mundo, a Amazônia, a Assembleia Sinodal Arquidiocesana, no ano 2022, assumiu essa missão como um dos grandes desafios, que está se concretizando de modo transversal em todas as dimensões da missão.

O cuidado da criação em todos os espaços

Na frente desse trabalho está a Comissão para a Ecologia Integral que quer levar esse cuidado com a criação a todos os espaços: doméstico, laboral, comunitário e eclesial. As diversas práticas de ecologia integral na Arquidiocese de Manaus estão sendo divulgadas através de uma publicação que tem como nome “Semeaduras”. Um pequeno texto que ajuda a conhecer e espalhar práticas que deveriam ser assumidas por todos aqueles que acreditam no Deus Criador, mas também por aqueles que se preocupam com o futuro do planeta e da humanidade.

Na Arquidiocese de Manaus, segundo o texto, diversas paróquias e áreas missionárias realizam gestão de resíduos, um exemplo que leva à Comissão para a Ecologia Integral a lançar o desafio de assumir essa prática por parte daqueles que ainda não a iniciaram. Nesse caminho da ecologia integral se faz necessário impulsionar parcerias institucionais e comunitárias com outras religiões, associações de moradores, universidades, escolas, cooperativas e grupos de diferentes segmentos.

As ações e os educadores ambientais

Dentre as práticas cada vez mais presentes, o documento “Semeaduras” fala sobre a coleta de resíduos eletrônicos, de óleo de cozinha para a fabricação de sabão ecológico, de materiais recicláveis, as hortas comunitárias, a coleta de material orgânico para compostagem, ações sociopolíticas em defesa da casa comum, feiras de economia solidária, por exemplo. Essas práticas são assumidas a partir de campanhas educativas com foco no cuidado da casa comum, especialmente na catequese, tendo como fundamento a encíclica Laudato si', em vista de um novo estilo de vida.

Nos últimos anos, tem surgido na Arquidiocese de Manaus os educadores ambientais. Eles iniciaram sua missão na Festa de Pentecostes, o maior evento religioso da Igreja de Manaus, mas aos poucos estão se fazendo presentes em outros momentos e espaços. A missão é orientar sobre s redução dos resíduos e a conservação do ambiente, a formação para as causas indígenas, os projetos de transição energética, com fontes de energia eólica e solar. Iniciativas que são divulgadas no Programa Laudato si', que toda semana, na Rádio Rio Mar, veículo de comunicação da arquidiocese, aborda temáticas relacionadas à espiritualidade ecológica e questões socioambientais.

Os projetos arquidiocesanos

Em nível arquidiocesano são vários os projetos desenvolvidos: Projeto Educação em Saúde Ambiental, com a participação de crianças e adolescentes; Casa Amazônica de Francisco e Clara, em vista de uma educação e espiritualidade ecológicas a serviço dos povos amazônicos; Associação de Catadores Filhos/as de Guadalupe, que gerencia resíduos sólidos e promove a formação no campo da ecologia integral; Projeto “Papel de cada um na casa comum”; e o Projeto Horta Escola.

Conhecer essas práticas é de extrema importância, ainda mais no Tempo de Oração pelo Cuidado da Casa Comum e às portas do 14º Mutirão Brasileiro de Comunicação, que será realizado em Manaus de 25 a 28 de setembro, com o tema “Comunicação e Ecologia Integral: transformação e sustentabilidade justa”, que reúne estudantes, profissionais e representantes de pastorais e agentes sociais de todo o Brasil.

* Manaus/AM

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Para um feminismo cristão: reflexões sobre a Carta Apostólica “Mulieris Dignitatem” (Parte 2/3)

Para um feminismo cristão (Crédito: Opus Dei)

Para um feminismo cristão: reflexões sobre a Carta Apostólica “Mulieris Dignitatem”

Estudo de Jutta Burggraf, Doutora em Sagrada Teologia e em Pedagogia, publicado em “Romana”, nº 7 (1988).

14/08/2020

2. Pessoa, comunidade, dom de si

Já nas catequeses das quartas-feiras de 1979 a 1981 sobre a Teologia do Corpo, João Paulo II havia analisado a fundo os três primeiros capítulos do livro do Gênesis. Seguindo aquela exegese, reafirma agora que os textos sobre a criação do homem revelam “a base imutável de toda a antropologia cristã” (MD, 6).

Gn 1,27 afirma explicitamente que Deus criou o homem – homem e mulher – à sua imagem e semelhança. Isto significa, em primeiro lugar, que os dois sexos possuem a mesma natureza de seres racionais e livres; que ambos receberam o mandato comum de submeter a terra; e finalmente que cada um dos dois tem uma relação direta e pessoal com Deus. Quer dizer, tanto o homem como a mulher são pessoas: são – como repete frequentemente o Papa citando a Gaudium et Spes (n. 24) – amados por Deus “por si mesmos”, e nisto reside sua dignidade (cfr. MD, 7, 10, 13, 18, 20, 30). A mulher não é, pois um ser definido através do homem e em função do homem. Não recebe do homem a sua própria dignidade, mas a possui originariamente em si mesma.

Gn 2, 18-25 continua posteriormente a ensinar as verdades fundamentais sobre o homem. Narra a criação da própria matéria, daquela costela, na qual João Paulo II vê uma expressão plástica da identidade da natureza entre o homem e a mulher. Esta é como o “outro eu” na humanidade comum (MD, 6). A unidade dos dois expressa assim, numa medida ainda mais elevada, a semelhança com Deus na medida em que, de certo modo, reproduz aquela unidade na distinção que existe de modo supremo na Trindade.

A fé trinitária, aqui pressuposta pelo Papa, afirma, com efeito, que a vida divina é comunhão do Pai com o Filho e o Espírito Santo, os quais sendo Um Único e o mesmo Deus Eterno e Onipotente, distinguem-se realmente como Pessoas[4]. O Pai é o que é pelo Filho. Sua “personalidade” se realiza em ser Pai do Filho: está em relação total e constitutiva com o Filho, com o Qual, pelo Qual e no Qual é. Da mesma forma, o Filho é o que é pelo Pai. Sua “personalidade” consiste em ser Filho do Pai e na correspondência ao amor que recebe eternamente d’Ele. É com o Pai, no Pai e pelo Pai. E o Espírito Santo é o Amor subsistente do Pai e do Filho; procede de ambos como fruto da relação Pai-Filho e, ao mesmo tempo, misteriosamente, torna possível tal relação. Por Ele, com Ele e n’Ele, o Pai ama o Filho e o Filho ama o Pai. Eis como o Espírito Santo consuma a unidade e a diversidade na Trindade.

João Paulo II destaca que, embora Deus tenha querido revelar-se em seu desígnio de salvação, sobretudo com nomes masculinos, isso não significa que Ele pode ser concebido segundo categorias finitas de criaturas. N’Ele se baseiam todas as perfeições das criaturas e, portanto, não só a paternidade, mas também a maternidade. O Santo Padre indica muitos textos nos quais a Escritura nos mostra os traços maternos do Amor de Deus, que consola seu próprio Filho (Is 66, 13), não O pode esquecer (Is 49, 14-15), abraça-O carinhosamente (Sl 131, 2-3), cuida d’Ele e O nutre (Is 31, 20): “O amor de Deus é apresentado em muitas passagens como amor masculino de esposo e pai (cfr. Os 11, 1-4; Jr 3, 4-19) mas às vezes também como Amor feminino de mãe” (MD, 8).

Alguns expoentes da teologia feminista[5]. insistiram frequentemente, recentemente e com gosto, sobre a “feminilidade” de Deus. Estas teses, mesmo remediando indubitáveis lacunas da teologia tradicional, nem sempre conseguiram respeitar a justa medida. João Paulo II parece aceitar os detalhes mais relevantes que, por outro lado, se podem já encontrar nos autores dos primeiros séculos[6], mas os harmoniza com a tradição da Igreja. A descoberta do “rosto materno” de Deus, tão querido para a teologia de hoje, contribuirá realmente para enriquecer os contornos da imagem de Deus se não obscurecer o aspecto paterno. Pode-se, pois, afirmar que em Deus encontramos tanto a “masculinidade” como a “feminilidade”, não, no entanto, através de um processo de humanização de estilo pagão, mas analogicamente, como arquétipo ideal, de modo exemplar e eminente (cfr. MD, 8).

Ser pessoa à imagem e também à semelhança de Deus significa, portanto, para o homem, existir “em relação” a outro e encontrar nisso um novo eu na comunicação do amor. Ser homem quer dizer comunhão interpessoal (cfr. MD, 7), já que o ser humano não foi criado sozinho, mas como homem e mulher desde o princípio: “Na unidade dos dois, o homem e a mulher são chamados desde o princípio não só a existir um ao lado da outra ou também juntos; mas são também chamados a existir reciprocamente um para o outro” (MD7). Baseando-se nesta observação, João Paulo II esclarece que a ajuda da qual fala o Gênesis é uma “ajuda recíproca” do homem para a mulher e da mulher para o homem. Os dois sexos se ajudam a ser plenamente humanos. A própria natureza os ordenou para completar-se mutuamente, de modo que cada um seja, no próprio âmbito, superior ao outro. Ambos possuem qualidades espirituais específicas, como confirma a pesquisa médico-psicológica moderna[7].

Por outro lado, a palavra “ajuda” é levada por João Paulo II a significar o fato de que a pessoa humana como tal, homem e mulher, alcança sua própria plenitude só no dom sincero de si. Realiza-se em dar-se. Aqui está o fundamento de todo o êthos humano. A pessoa é, pois, revelação de uma dignidade e de uma vocação (cfr. MD, 7). Quanto às relações entre os dois sexos, trazem consigo que o homem e a mulher foram criados para servir-se mutuamente, em mútua e livre subordinação por amor.

3. A mulher e o domínio masculino

Os textos do Gênesis sobre a situação do homem e da mulher no “princípio” contêm também a explicação das desarmonias da realidade: “O pecado se inscreve precisamente neste princípio e se revela como contraste e negação” (MD, 9). Como recorda o Concílio Vaticano II, a imagem de Deus no homem, mesmo não tendo sido apagada pelo pecado, foi consideravelmente ofuscada (MD, 9)[8]. A perda da íntima união originária com o Criador implica uma alteração na relação recíproca entre os sexos. O homem e a mulher se encontram um frente à outra e inclusive a natureza se rebela contra eles (cfr. MD, 9).

Quanto mais o homem se afasta de Deus pelo pecado, tanto menos reconhece que só pode realizar a própria vida através da preocupação pelo outro e menos respeita os outros homens. João Paulo II observa que as tristes consequências desta alteração afetam sobretudo o sexo feminino: o homem desrespeita a dignidade da mulher e a priva de seus direitos, degradando-a com frequência ao fazê-la objeto de posse e de prazer. O domínio e o utilitarismo substituem o amor e o dom de si, com todas as formas de traição à pessoa que estas palavras encerram. O Santo Padre condena energicamente as injustiças à quais está exposta a mulher e afirma que elas ferem também o homem: pois quando ele ofende a dignidade e a vocação da mulher “age contra a própria dignidade pessoal e a própria vocação” (MD, 10).

João Paulo II põe-se sem vacilações ao lado dos que lutam pela igualdade de direitos sociais e políticos das mulheres. Também a propósito disto, os ensinamentos do Concílio Vaticano II são claros. O texto mais famoso não se encontra na Mulieris Dignitatem, mas está na Gaudium et Spes, que por sua vez é citada 13 vezes na Carta Apostólica: “No entanto, qualquer tipo de discriminação dos direitos fundamentais da pessoa, tanto no campo social como no cultural, em razão do sexo, da estirpe, da cor (...) deve ser superado e eliminado, como contrário ao desígnio de Deus”[9]. Em outro lugar, o documento diz: “As mulheres reivindicam a paridade com os homens, não só de direito, mas também de fato, onde ainda não a alcançaram”[10].

Apesar de alguns abusos e da unilateralidade, os movimentos pelos direitos da mulher contribuíram inegavelmente para significativos progressos no desenvolvimento da sociedade. Mas não se pode esquecer que tais passos em frente são, apesar de tudo, insuficientes, porque a defesa da dignidade da pessoa representa, em cada geração, uma tarefa sempre nova para cada homem e cada mulher (MD, 10). A oposição das mulheres ao domínio dos homens não deve levar à “masculinização” e à deformação da natureza feminina. Neste sentido, Mons. Escrivá escreveu: “Desenvolvimento, maturidade, emancipação da mulher, não devem significar uma pretensão de igualdade – de uniformidade – uma imitação do modo de atuar masculino: isso seria um logro, seria uma perda para a mulher”[11]. A igualdade não deve ser confundida com a identidade, porque do contrário a mulher perderia tudo o que constitui “a sua riqueza essencial”. “Os recursos pessoais da feminilidade certamente não são menores que os recursos da masculinidade, mas são diversos” (MD, 10); seu desenvolvimento requer a libertação de qualquer coação arbitrária (MD, 10).

Sobre as consequências do pecado instaura-se, no entanto, a redenção que, neste contexto, representa uma reintegração da ordem original a um nível superior, restituição da dignidade da mulher e do homem. Como Eva é “testemunha desde o princípio”, Maria é “testemunha do novo princípio e da nova cultura” (MD, 11)[12]. Ela é “o novo princípio da dignidade e da vocação da mulher, de todas as mulheres e de cada uma” (MD, 11). Tanto no início como no momento crucial da história da humanidade, encontramos uma mulher que influi de modo determinante no desenvolvimento da história. A consideração desta realidade poderia fazer desaparecer definitivamente o costume de designar a mulher como o sexo “fraco” ou “passivo”. Seu papel no destino da humanidade revelar-se-ia decisivo, se ela realmente desenvolvesse as virtualidades das quais é depositária para a salvação do mundo.

4. Cristo, supremo protetor da mulher

Cristo oferece um testemunho riquíssimo “do que a realidade da redenção significa para a dignidade e a vocação da mulher” (MD, 12). Inclusive quem escuta com atitude crítica o ensinamento da Igreja, reconhece como Cristo “se constituiu, perante seus contemporâneos, promotor da verdadeira dignidade da mulher” (MD, 12). Não é, pois, uma casualidade o fato de o capítulo sobre Cristo e as mulheres marcar o núcleo central da Mulieris Dignitatem: com efeito, é Cristo quem oferece a norma e a medida da ação dos seus discípulos.

O Santo Padre recorda com alguns exemplos como Jesus restabelece a ordem alterada pelo pecado, como reconcilia o homem com Deus e com os outros homens, como promove a justiça acolhendo especialmente os débeis. Entre os setores da população mais expostos à injustiça destacam-se, no judaísmo tardio, as mulheres, às quais nem sequer era reconhecida plenamente uma personalidade madura. Pesquisas recentes mostraram, entre outras coisas, que o lugar da mulher na casa não era com o marido, mas ao lado dos filhos e dos escravos. O estudo da Lei lhes era inclusive expressamente proibido. Um famoso rabino formulou assim esta proibição: “melhor queimar as palavras da Torá, antes que confiá-las a uma mulher”[13].

Cristo opôs-se radicalmente a semelhante discriminação. A sua conduta mostra-o não apenas totalmente livre dos preconceitos sociais da época, mas também positivamente disposto a testemunhar, através de relações espontâneas e diretas, que Deus ama qualquer criatura “por si mesma” (MD, 13). No acolhimento de Jesus às mulheres, os contemporâneos não conseguiram ver um testemunho da igualdade dos dois sexos; assim, alguns se escandalizaram; os próprios discípulos “se maravilharam” (Jo 4, 27). Mas Ele tinha vindo liberar o homem, e não se deixou limitar pelos convencionalismos e considerações de oportunidade, que teriam desnaturalizado a sua missão salvadora. Os motivos que fizeram de Cristo “sinal de contradição” (Lc 2, 334) foram eminentemente teológicos e faziam referência à sua própria personalidade divina; mas entre as razões de tão tenazes oposições aparece a sua misericórdia para com as mulheres e, em particular, para com as que eram consideradas “pecadoras públicas”. Com relação a semelhantes situações, João Paulo II sublinha a atualidade do problema recordando o perpetuar-se do juízo discriminatório que ainda tende a fazer da mulher a única culpada e condena-a a pagar “sozinha”, enquanto esquece as transgressões ou os abusos do homem que a abandona com sua maternidade, rejeita a própria responsabilidade diante da nova vida e não raramente a empurra ao aborto (cfr. MD, 14).

E além de tudo isso, Cristo compromete profundamente as mulheres no plano da redenção, chamando-as a colaborarem na instauração do reino (MD, 15): fá-las participantes da mensagem evangélica não só através da transmissão da fé, mas ainda lhes confia um papel de destaque no anúncio da salvação. É impressionante naquele tempo que Ele se entretenha em dialogar com as mulheres sobre os mistérios de Deus. E elas respondem-lhe mostrando uma especial sensibilidade, que João Paulo II define como “autêntica ressonância da mente e do coração” (MD, 15). É uma resposta de fé que supera qualquer obstáculo e oferece a prova definitiva do sim aos pés da Cruz. Na hora suprema são as mulheres que dão o testemunho mais vigoroso de união com Cristo. “Nesta, que foi a mais dura prova de fé e de fidelidade, as mulheres se mostraram mais fortes que os apóstolos” (MD, 15).

Elas foram também as primeiras que testemunharam a Ressurreição. Os acontecimentos da manhã de Páscoa confirmam que Cristo confia sobretudo às mulheres o anúncio da Boa Nova restituindo-lhes assim plenamente a sua dignidade. Não surpreende que a defesa da igual dignidade dos filhos de Deus e da “nova medida” alcançada em Cristo pela peculiar vocação da mulher, realizada pelo Santo Padre, no n. 16 da Mulieris Dignitatem, tenha levado a chamá-la de um documento do feminismo cristão.

Jutta Burggraf


[4] Cfr. SÃO THOMAS DE AQUINO, S. Th. I, qq. 28-38; SANTO ALBERTO MAGNO, S. Th. I, tr 9, qq. 37 ss; Ed. Col. (1951 ss), 34, 1.

[5] Cfr. M. DALY, Jenseits von Gottvater, München 1980 (Boston 1973).

[6] Cfr. CLEMENTE DE ALEXANDRIA, Quis dives salvetur? 37, 2 ss: PG 9, 642 ss.

[7] Cfr. B. FLAD-SCHNORRENBERG, Der wahre Unterschied. Frau sein-angeboren oder angelernt? Freiburg 1978 ; F. MERZ, Geschleschtsunterschiede und ihre Entwicklung. Lehrbuch der differenziellen Pyschologie III, Göttingen 1979 ; E. SULLEROT, die Wirklichkeit der Frau, Paris 1978.

[8] Cfr. CONCÍLIO VATICANO II, Const. Past. Gaudium et Spes, n. 13.

[9] Ibid., n. 29

[10] Ibid., n. 9; cfr. também MD, 1

[11] JOSEMARIA ESCRIVÁ, Entrevistas com Mons. Josemaria Escrivá, n. 87.

[12] Cfr. SANTO AMBRÓSIO, De institutione virginum, V, 33: PL 16, 313.

[13] Cfr. G. SIEGMUND, Die Stellung der Frau in der Welt von heute, Stein am Rhein 1981, p. 54.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/para-um-feminismo-cristao-reflexoes-sobre-a-carta-apostolica-mulieris-dignitatem/

A palavra como veículo de fraternidade, não de ódio

O apelo de Francisco à fraternidade (Vatican News)

A PALAVRA COMO VEÍCULO DE FRATERNIDADE, NÃO DE ÓDIO

21/09/2022

Dom Arnaldo Carvalheiro Neto
Bispo Diocesano de Jundiaí

A convivência fraterna precisa ser buscada e não se conhece melhor instrumento para isso que a palavra. É claro que ações concretas surtem efeitos e são necessárias, mas mesmo estas devem ser precedidas de palavras. A quadra histórica que vivemos está marcada pelo discurso de ódio – que, ironicamente, reforça a ideia do poder da palavra -, pelo rechaço violento do irmão que pensa diferente, pela forjadura e a disseminação de mentiras. Trata-se de uma guerra fratricida criada em nome da busca pelo poder, que vai arrastando incautos para sua jornada cruel.

A lucidez e a percepção temporal do Papa Francisco captaram o uso recorrente da palavra como veículo de ódio, em substituição ao seu papel como difusora do amor fraterno, como ferramenta de aproximação entre pessoas cujos credos, raças e ideologias são diferentes, mas que se encontram no mesmo patamar diante do amor divino. Somos todos irmãos e como irmãos deveríamos conviver, daí a encíclica papal Fratelli Tutti.

Todo destaque midiático e pronunciamentos de indignação serão pouco para repudiar o assassinato a facadas de um homem por outro, como vimos há poucos dias em Confresa (MT), motivado por antagonismo político-partidário. Por que tentar impor crenças ao próximo e, quando esse empenho revela-se inglório, tirar lhe a vida?

Vê-se o ódio sobrepor-se ao amor, a intolerância derrotar o respeito.

Na Fratelli Tutti, o Papa lembra que São Francisco de Assis “não se envolveu na guerra dialética impondo doutrinas, mas comunicou o amor de Deus. Ele despertou o sonho de uma sociedade fraterna”. E é da Oração de São Francisco que extraímos a mais contundente mensagem sobre uso da palavra como arma do amor: “Senhor, fazei de mim um instrumento de vossa paz. Onde houver ódio, que eu leve o amor. Onde houver ofensa, que eu leve o perdão. Onde houver discórdia, que eu leve a união. Onde houver dúvida, que eu leve a fé. Onde houver erro, que eu leve a verdade. Onde houver desespero, que eu leve a esperança. Onde houver tristeza, que eu leve a alegria. Onde houver trevas, que eu leve a luz!”

O acirramento dos ânimos comum aos períodos eleitorais não pode nos distanciar da mensagem de fraternidade contida na Fratelli Tutti e no exemplo de abnegação de São Francisco. Tampouco pode nos obnubilar a visão diante das profundas injustiças sociais que nos afligem desde sempre e que, provavelmente, não desaparecerão após o pleito eleitoral, como num passe de mágica.

Os candidatos permanecem no terreno do discurso predominantemente populista e demagógico, sem discutir com profundidade projetos para superação dos graves problemas que afligem nosso povo. É tarefa cidadã e cristã denunciar essa triste realidade, como fez a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil na Mensagem da CNBB ao Povo Brasileiro sobre o Momento Atual, por ocasião de sua 59ª Assembleia Geral, em Aparecida.

Claro e cristalino, eis um trecho da mensagem da CNBB:

“Vítimas de uma economia que mata, celebramos as conquistas desses 200 anos de independência conscientes de que condições de vida digna para todos ainda constituem um grande desafio. É necessário o compromisso autêntico com a verdade, com a promoção de políticas de Estado capazes de contribuir de forma efetiva para a diminuição das desigualdades, a superação da violência e a ampliação ao acesso a teto, trabalho e terra. Comprometidos com essas conquistas e inspirados pela cultura do diálogo e do encontro, podemos ser uma nação realmente independente e soberana”.

Não escapa a nós, bispos brasileiros, o impacto destrutivo que a mentira – sob a forma de fake news – exerce sobre a democracia, bem como a escravização mental de fiéis com fins eleitorais: “É motivo de preocupação a manipulação religiosa e a disseminação de fake news que têm o poder de desestruturar a harmonia entre pessoas, povos e culturas, colocando em risco a democracia. A manipulação religiosa, protagonizada por políticos e religiosos, desvirtua os valores do Evangelho e tira o foco dos reais problemas que necessitam ser debatidos e enfrentados em nosso Brasil. É fundamental um compromisso autêntico com o Evangelho e com a verdade”.

 Mãos à obra, fratelli, para que a palavra passe a nos unir em Deus e não mais nos dividir!

Fonte: https://www.cnbb.org.br/

Santa Hildegarda de Bingen

Santa Hildegarda de Bingen (A12)

Santa Hildegarda de Bingen

17 de setembro

 Santa Hildegarda von Bingen nasceu em 1098, na Alemanha, em uma família nobre. Desde criança, foi levada ao Mosteiro de Disibodenberg, onde recebeu formação religiosa sob a orientação de Jutta von Sponheim. Nesse ambiente monástico, Hildegarda cresceu em espiritualidade e conhecimento, preparando-se para uma vida de entrega a Deus.

Muito cedo, destacou-se por sua inteligência e múltiplos talentos. Foi escritora, médica, pintora, musicista, dramaturga e, sobretudo, mística. Suas visões a tornaram conhecida como a “sibila do Reno” (sibila = profetisa) e, com a permissão de seus superiores, passou a ditar obras como o “Liber Scivias”, que ainda hoje inspira fiéis e estudiosos.

Suas composições musicais, reunidas em “Symphonia celestium revelationum”, continuam sendo executadas em concertos em todo o mundo. Além disso, escreveu peças teatrais e dirigia encenações com as monjas, unindo fé, arte e reflexão. Tornou-se abadessa e fundou comunidades monásticas, como os mosteiros de Bingen e Eibingen, que marcaram sua missão.

Hildegarda também se dedicou às ciências da natureza. Foi pioneira no estudo das propriedades medicinais das plantas e na produção de remédios naturais. Seu trabalho é considerado precursor da homeopatia. No campo da alimentação, inovou ao incluir o lúpulo na cerveja, reconhecendo seus efeitos conservantes e medicinais.

Apesar de falecida em 1179, sua santidade foi reconhecida oficialmente apenas em 1584, pelo Papa Gregório XIII. Em 2012, o Papa Bento XVI a proclamou Doutora da Igreja, título concedido a santos cujos ensinamentos têm grande relevância para toda a Igreja.

A vida de Hildegarda continua a inspirar gerações. Em 2009, sua história foi retratada no filme Vision, da diretora Margarethe von Trotta, com a atriz Barbara Sukowa no papel principal. Sua memória é celebrada no dia 17 de setembro, e sua obra permanece viva como testemunho de fé, inteligência e dedicação a Deus.

Reflexão:

A espiritualidade de Santa Hildegarda nos recorda que a fé não se separa da vida, mas ilumina todas as dimensões do existir. Em sua obra e em suas visões, ela nos mostra como a criação reflete a presença de Deus e como a ciência, a arte e a mística podem caminhar juntas em harmonia com a fé. Sua vida testemunha que o cristão é chamado a integrar conhecimento e espiritualidade em favor da vida. Seu exemplo nos convida a viver com coragem, discernimento e confiança na ação do Espírito Santo. Hildegarda soube transformar seus dons em serviço, colocando-os a serviço da comunidade e da Igreja. Ela nos ensina que cada um, com os talentos que recebeu, pode colaborar com a obra de Deus no mundo e participar do cuidado da criação e da promoção do bem comum.

Oração:

Oração a Santa Hildegarda Santa Hildegarda, a senhora realizou inúmeros feitos nesta Terra e tudo o que você fez, foi por amor e obediência ao Nosso Senhor, Jesus Cristo. Sou imensamente grato(a) pelo teu exemplo, pois ele me anima, fortifica a minha alma e traz esperanças ao meu coração. Através de teu exemplo, nobre Santa Hildegarda, eu tomo consciência que, assim como você fez, eu também sou capaz de vencer os obstáculos que aparecem em minha vida com discernimento, sabedoria e coragem. Confiante na Presença de Amor Infinito de Deus em minha vida e em meu coração, eu sei que quando eu permito, o Senhor guia meus passos, minha inteligência e minhas ações segundo a Sua Vontade e assim, a Vitória em minha vida é uma certeza, pois com Deus, somos sempre vitoriosos(as). Hoje, diante de ti, eu venho aqui pedir a tua intercessão para (dizer a intenção) pois sei que você é capaz de ajudar-me neste pedido que te rogo agora. Querida Santa Hildegarda, ajude-me a vencer minhas fraquezas e vícios, ajuda-me a fortalecer minha força de vontade e sobretudo, ajude-me a seguir com integridade e coragem, na missão de vida que Deus me confiou. Assim como você trouxe a visão para uma criança cega, ao lavar seus olhos com a água do rio Reno, eu te imploro: lave também meus olhos com a sagrada água vinda dos Céus e cure-os de todo o mal (físico ou espiritual) que possa afastar-me do caminho de Deus. Que eu tenha olhos de ver! Santa Hildegarda, eu te agradeço profundamente as dádivas que tem trazido em minha vida e também estas que te pedi aqui com o coração aberto e sincero. Muito obrigado(a) Santa Hildegarda de Bingen, por sua presença em minha vida. Amém!

Fonte: https://www.a12.com/

terça-feira, 16 de setembro de 2025

Para um feminismo cristão: reflexões sobre a Carta Apostólica “Mulieris Dignitatem” (Parte 1/3)

Para um feminismo cristão (Crédito: Opus Dei)

Para um feminismo cristão: reflexões sobre a Carta Apostólica “Mulieris Dignitatem”

Estudo de Jutta Burggraf, Doutora em Sagrada Teologia e em Pedagogia, publicado em “Romana”, nº 7 (1988).

14/08/2020

A Carta Apostólica Mulieris dignitatem foi publicada numa época em que se pode observar uma mudança no movimento feminista. Já não estava tão na moda o feminismo radical, de matiz ecologista, com seus cultos rituais de bruxaria e a proclamação do poder mágico-materno da mulher; havia-se estendido, antes, um feminismo “moderado” social (corporate feminism) das assim chamadas “mulheres de carreira”. N’Ele, o casamento é tolerado, contanto que não ameace a autonomia da mulher e não limite as suas possibilidades profissionais com a “armadilha da maternidade”. Na atualidade, os partidos políticos mais contrapostos, do ponto de vista ideológico, convergem para o compromisso de ampliar a quota de acesso das mulheres às diversas profissões, incluída a militar. Por outro lado, apesar de todas as tentativas de emancipação, avança de modo alarmante a comercialização da mulher na publicidade, no cinema, no turismo e até nas belas artes.

Faz tempo que a insegurança sobre a questão feminina penetrou inclusive em alguns setores da teologia e da vida eclesial. Cresce na medida em que as confissões cristãs, que surgiram da Reforma protestante, permitem, cada vez mais, o acesso de mulheres às funções pastorais.

Talvez nunca se tenha discutido e polemizado tanto sobre os direitos femininos. E as frentes que se formaram a partir destes debates, talvez nunca tenham sido tão compactas: uma é acusada de encaixotar a mulher entre a cozinha e o jardim da frente da casa, limitando-a ao campo das funções domésticas; outra é admoestada por alimentar reivindicações egocêntricas e individualistas. O caráter esquemático dessas reduções é evidente, mas de qualquer forma é inegável que o diálogo entre as duas posições acima indicadas chega a ser cada vez mais difícil. Precisamente por isto, as reflexões desenvolvidas por João Paulo II na Mulieris dignitatem são tão reconfortantes. Com extraordinária sensibilidade o Santo Padre supera as barreiras já consolidadas e, mantendo-se aberto às verdades presentes em cada uma das duas concepções, une-as – sob a luz da fé viva – em um nível superior.

A meditação do Papa não tem como ponto de partida os dados empíricos sobre a situação da mulher, já que são aparentemente insuficientes, não só por sua intrínseca variabilidade, mas também pelas diferenças existentes, por exemplo, entre países industrializados e os de terceiro mundo. Considera, no entanto, a concepção cristã da mulher e tira dela os pressupostos para uma avaliação de fundo da realidade presente e das exigências que derivam dela para a mulher e para o homem.

Tal avaliação de fundo não é constituída pelas vicissitudes do movimento para a emancipação feminina e sim pela história da salvação. João Paulo II propõe como tema da própria reflexão tudo o que o Evangelho de Cristo diz “à Igreja e à humanidade” a respeito da dignidade e da vocação da mulher (MD, 2). Enquadra, por conseguinte, o problema num contexto bíblico muito atraente e profundo. Sobre o fundamento da revelação desenvolve um feminismo cristão que, na mesma medida em que se propõe promover todas as possibilidades de crescimento da mulher, afasta-se das tendências que a separam do plano da criação e da salvação.

Mulieris dignitatem responde a uma petição dos participantes da VII Assembleia Ordinária do Sínodo dos Bispos, que teve lugar em Roma no ano de 1987, sobre o tema: “A vocação e a missão dos leigos na Igreja e no mundo, vinte anos depois do Concílio Vaticano II”. No princípio não parecia que a questão feminina devesse ser incluída entre os problemas do Sínodo. Efetivamente, os Lineamenta preparatórios de 1/02/1985, enviados às diversas Igrejas particulares não faziam alusões explícitas à mulher. No entanto, o Instrumentum laboris do ano de 1987, quer dizer, o documento de trabalho do Sínodo, já fazia alusão ao tema em três passagens diferentes. Por fim, encontravam-se realmente vinte e oito mulheres entre os sessenta representantes dos leigos que estavam presentes na Assembleia. E o Card. Hyacinthe Thiandoum, Arcebispo de Dakar, enfrentou diretamente a questão no discurso de abertura; quando falou nada menos que da necessidade de eliminar as discriminações “não objetivas” do sexo feminino.

A relação de todas as propostas surgidas durante as discussões, elaborada ao termo dos trabalhos, contém dois longos parágrafos dedicados à mulher (proposições 46 e 47)[1]. Nela se expressa o desejo de estudar atentamente os fundamentos antropológicos e teológicos da feminilidade, de aprofundar na teologia do matrimônio e de revalorizar tanto a maternidade como a virgindade. A Mulieris dignitatem constitui precisamente o cumprimento de tais desejos. O fato de que o Santo Padre tenha querido dedicar uma Carta Apostólica a esta única questão, em vez de limitar-se a incluí-la entre outros temas no documento conclusivo do Sínodo, demonstra a sua importância.

Antes de passar ao exame do conteúdo do documento, não é demais recordar que esta Carta se dirige tanto às mulheres como aos homens, já que a aproximação de João Paulo II do feminismo cristão se baseia precisamente no fato de envolver toda a humanidade na superação dos problemas velhos e novos.

1. Maria, modelo para a mulher e para o homem

Mulieris dignitatem foi publicada no fim de um Ano Mariano e representa de certa forma o seu fruto e o seu legado. João Paulo II mostra-o amplamente quando precisa que o modelo para a mulher não pode estar na base só de definições conceituais de caráter filosófico ou teológico e sim dirigindo o olhar sobretudo para a “Mulher” da Escritura, para Maria que, graças à sua união excepcional com Deus, constitui a expressão mais perfeita da dignidade e da vocação humanas. O acontecimento central da história da salvação, está inseparavelmente unido a uma extraordinária elevação da mulher (cfr. MD, 3). Deus, com efeito, escolheu uma mulher para estreitar a aliança definitiva com a humanidade e, por isso mesmo, faz dela a representante e o modelo da Igreja e da humanidade inteira, homens e mulheres. A partir desta perspectiva, qualquer argumentação que diminua o papel da mulher, perde inclusive o último pingo de razão.

Maria participa da redenção precisamente como mulher. Como tal, é a primeira a receber, conservar e transmitir a Boa Nova; é em sua feminilidade que o amor de Deus se interioriza e aprofunda em medida sem igual. “Aquela plenitude de graça, concedida à Virgem de Nazaré para chegar a ser Theotókos, significa ao mesmo tempo, a plenitude da perfeição do que é característico da mulher, daquilo que é feminino” (MD, 5).

Em Maria, encontram-se completas, na forma mais sublime, todas as possibilidades da mulher. Por isso, vivendo unida à Mãe de Deus, imitando-a e procurando imitá-la, a mulher desenvolve em grau máximo a própria personalidade. Esta é uma ideia que João Paulo II já havia claramente formulado na Encíclica Redemptoris Mater (25/03/1987): “Com efeito, a feminilidade acha-se em uma relação singular com a Mãe do Redentor (...). Pode-se, portanto, afirmar que a mulher, olhando a Maria, encontra nela o segredo para viver dignamente sua feminilidade e realizar sua verdadeira promoção” (n. 46).

É bem sabido que certas correntes do feminismo rejeitam veementemente a imagem de Maria como ponto de referência da realização da mulher, acusando-a de haver oferecido no passado um pretexto teológico à tendência católica de colocar a mulher em posições subordinadas[2]. Contra esta atitude, João Paulo II sublinha a liberdade de Maria que entrou com uma “participação plena” de seu “eu pessoal e feminino” naquela relação única com Deus (MD, 49). Doou consciente e voluntariamente todo seu ser físico e espiritual a Deus, quando se definiu a si mesma como a escrava do Senhor (Lc 1, 38).

Reconhecer que uma interpretação errônea dessa expressão pode induzir à manutenção da mulher em situações de subordinação, ao ponto de fazer passar, como qualidades femininas, a timidez e o ânimo encolhido, não significa que a virtude da caridade e da disponibilidade para servir, tenham que ser simplesmente liquidadas como um fragmento de escravidão. A rejeição do “serviço” coincide com efeito com a exaltação prática do egoísmo, quer dizer, com a atitude espiritual que constitui a maior ameaça à realização pessoal, tanto da mulher como do homem. É necessário, no entanto, sondar as palavras em que Maria declara ser a “serva” do Senhor em toda a sua incomparável profundidade.

O Santo Padre sublinha, sobretudo, que também Cristo se define a si mesmo como “servo” (cfr. MD, 5). Justamente no momento mais intenso da declaração de sua missão messiânica, afirma com desconcertante simplicidade: “O Filho do homem, com efeito, não veio para ser servido e sim para servir” (Mc 10, 45). Palavras que, além de manifestar a intensa união espiritual entre o Filho e a Mãe, revelam como é excelsa a dignidade de servir do homem[3].

Quem é capaz de dar-se livremente aos outros, reflete em si a imagem de Deus e realiza, portanto, a própria humanidade com singular plenitude. Isto é amplamente desenvolvido no capítulo seguinte da Mulieris dignitatem que trata da relação entre ser pessoa e o serviço.

Jutta Burggraf


[1] Cfr. Elenchus definitivus propositionum, em “La Documentation Catholique”, 21 (1987) 1088-1100.

[2] Cfr. C. HALKES, Gott hat nicht nur starke Söhne, Güttersloh 1980, p. 117.

[3] O argumento está também desenvolvido na Encíclica Redemptor hominis, 4-III-1975, n. 21.

Fonte: https://opusdei.org/pt-br/article/para-um-feminismo-cristao-reflexoes-sobre-a-carta-apostolica-mulieris-dignitatem/

"Leo from Chicago": documentário do Vaticano sobre as raízes do Papa Leão

As raízes do Papa Leão XIV (Vatican News)

Uma viagem aos Estados Unidos, terra natal do Pontífice agostiniano, para aprofundar, através de vozes, imagens e testemunhos, começando pelos de seus dois irmãos Louis e John, a vida e a figura de Leão XIV que desde 8 de maio de 2025 guia a Igreja Católica universal. Em breve estará disponível nos canais oficiais da mídia vaticana.

https://youtu.be/RX5zgamx1Es

Vatican News

A infância, os laços familiares, as amizades, os estudos, a formação, a vocação, os primeiros passos na Vida Consagrada, o engajamento social, as paixões esportivas, os gostos alimentares. É um retrato aprofundado e, de certa forma, inédito do Papa Leão XIV, traçado no documentário “Leo from Chicago”. Uma produção da direção editorial do Dicastério para a Comunicação do Vaticano, em colaboração com a Arquidiocese de Chicago, que leva a reviver a história, até as raízes, do atual Pontífice em sua terra natal: os Estados Unidos.

A viagem, realizada pelos jornalistas Deborah Castellano Lubov, Salvatore Cernuzio e Felipe Herrera-Espaliat desenrola-se nos bairros de Chicago, começando pela casa da família no Dolton, com as memórias e relatos dos dois irmãos Louis Martin e John. Depois, as sedes, escolas e paróquias administradas pelos agostinianos; a União Teológica Católica; os lugares frequentados pelo então Pe. Prevost, como o restaurante Aurelio's Pizza ou o Rate Field, o estádio do time White Sox. Mas o itinerário se amplia até a Universidade de Villanova, a poucos quilômetros de Filadélfia, e a Port Charlotte (Flórida), residência do irmão mais velho.

São cerca de 30 testemunhas ligadas ao atual Pontífice que, através de histórias, recordações, fotografias e filmes, contribuem a aprofundar no documentário a figura daquele que, desde 8 de maio, foi chamado a guiar a Igreja universal. Um homem que já desde criança mostrava uma propensão para a vida religiosa, brincando de celebrar a missa e rezando orações em latim; que ainda muito jovem abraçou o caminho do discernimento para entrar na Ordem de Santo Agostinho; que empreendeu estudos matemáticos e teológicos, estabelecendo laços autênticos com os colegas de curso e se engajando em iniciativas em favor da vida. Um homem que deixou sua terra natal para ir ao Peru e que, com uma atitude serena e uma liderança decidida, conduziu uma das Ordens religiosas mais difundidas no mundo. Um homem que ouvia música dos anos 60-70, adorava dirigir, assistia à TV e acompanhava beisebol.

“Leo from Chicago” segue o documentário “León de Perú”, apresentado em junho deste ano sobre os anos de missão de Prevost no país sul-americano. Em breve estará disponível nos canais oficiais da mídia vaticana.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

ARTE: Masaccio...e a pintura tocou as coisas

São Pedro Entronizado, Capela Brancacci, Santa Maria del Carmine, Florença. Abaixo, detalhe do autorretrato de Masaccio | 30Giorni.

Arquivo 30Dias nº 11 - 2001

Masaccio...e a ​​pintura tocou as coisas

Antes dele, a pintura, no máximo, os havia tocado de raspão, mas agora os tocava com força. Assim Vasari descreveu a revolução operada pelo pintor toscano, cuja arte procede da simplificação: tudo deve ser claro, visível, inequívoco, desprovido de retórica. Em suma, deve ser fácil.

por Giuseppe Frangi

Masaccio nos observa da parede esquerda da Capela Brancacci. Ele é alto, com o rosto imponente de um homem de 25 anos, cabelos cacheados; seus olhos são escuros, profundos e parecem velados pela melancolia. Ele se pintou ao fundo da cena, representando São Pedro na Cátedra, acompanhado por seus três grandes amigos, Masolino, Brunelleschi e Leon Battista Alberti. No entanto, há um detalhe causado por uma medida de censura imposta a Filippino Lippi, que foi contratado pelos novos patronos para concluir a Capela Brancacci: na verdade, originalmente, Masaccio tocou o joelho de São Pedro com a mão, repetindo o gesto dos peregrinos diante da estátua de Arnolfo di Cambio sob as abóbadas da Basílica do Vaticano. Os censores provavelmente consideraram esse gesto indecoroso, uma preocupação mesquinha e moralista que nos privou de um detalhe revelador. Um detalhe, de certa forma, escrito no nome: Masaccio nasceu em 21 de dezembro de 1401, então festa de São Tomás, em San Giovanni Valdarno. Seus pais — o pai, tabelião, a mãe, uma jovem de dezesseis anos — lhe deram esse nome em homenagem ao apóstolo que colocou o dedo no lado de Cristo ressuscitado. Tomás mais tarde se tornou Masaccio, conta Giorgio Vasari, não por causa de seus maus modos, mas pela desleixo com que levava a vida: malvestido, sempre com a mente voltada para a pintura e perpetuamente sem dinheiro, pois geralmente se esquecia de receber o dinheiro depois de terminar suas obras.

No entanto, este rapaz da zona rural de Valdarno atingiu como um verdadeiro terremoto o meio artístico culto e refinado da cidade. Com ele, a pintura deixou de ser um farfalhar gracioso e esvoaçante, tornando-se um precipitado da realidade. Para continuar com a metáfora censurada do autorretrato, a pintura, que até então, na melhor das hipóteses, deslizava sobre as coisas, agora as tocava com força. Giorgio Vasari tem uma imagem impressionante para ilustrar o que a chegada de Masaccio implicou: até então, as figuras pintadas, mesmo pelos maiores mestres, não haviam tocado o chão. No máximo, escreve Vasari, "estavam na ponta dos pés". Com Masaccio, as figuras têm "os pés no plano". Então, Vasari usa uma palavra com poder onomatopeico: "lo scorto". Masaccio "fez o scortos", isto é, deu às figuras uma profundidade real; Não mais silhuetas elegantemente recortadas no espaço, mas corpos fortemente sustentados pela força da gravidade na Terra e possuindo uma espessura fisicamente perceptível.

Quatro séculos depois de Vasari, outro crítico, o mais importante do século XX, continuou na linha dessas intuições críticas iniciais. Roberto Longhi, em 1940, escreveu um ensaio tão envolvente quanto um romance, " Fatos de Masolino e Masaccio ". Nele, ele imagina as conversas dos dois homens nos andaimes da Capela Brancacci. Longhi "reimagina" Masolino, vinte anos mais velho, mais famoso e provavelmente também o proprietário original daquela encomenda, encolhido diante do avanço daquela nova e avassaladora forma de pintar. "Um colaborador independente quando conseguia um emprego", escreve Longhi, "um mentor insistente quando trabalhava com o mais velho: é assim que se deve imaginar a presença de Masaccio na fase inicial das obras de Carmine. Sugestões infindáveis, declarações peremptórias de princípios e, quem sabe, até repreensões e intimidações. Uma pressão psicológica constante; um protesto contra as casas pintadas por Masolino que, não se conformando aos princípios da perspectiva, pareciam feitas de papel machê; tamanha habilidade, quase arrogância, na composição das figuras, que fazia com que os personagens pintados pelo mestre mais velho parecessem figuras patéticas.

O resultado, de uma perspectiva histórica, foi que Masolino, em determinado momento, abandonou a cena. É fácil imaginá-lo exausto por uma comparação impossível. Ele correu para concluir uma encomenda providencialmente entregue da Hungria. Masaccio, no entanto, seguiu em frente, afrescos as cenas restantes. Nesse ponto, Longhi se apodera de uma categoria crítica rara e eficaz para transmitir a grandeza de Masaccio: situar figuras reais e sólidas no espaço; como consequência natural, ele as pintou com as sombras que projetavam. Essas são as primeiras sombras verdadeiras na história da pintura, que não apenas atestam a substância real dessas figuras, mas também as situam precisamente no tempo. Pois a sombra também testemunha a hora do dia em que o evento está ocorrendo.

Além disso, Masaccio tinha, no programa iconográfico dos Brancacci, um evento particularmente crucial para ele: a cena de Pedro curando os doentes com sua sombra. Poderia ele correr o risco de tal episódio parecer um conto de fadas para aqueles que o assistissem? Poderia um truque milagroso ter retratado a natureza extraordinária da obra? Não. Somente restaurando o verdadeiro poder da sombra, somente evitando qualquer ênfase, a história seria crível e verdadeira.

Se as figuras são reais, o espaço em que se movem também deve ser real. É por isso que Masaccio recorreu a uma revolução na perspectiva. Em suas mãos, a perspectiva perdeu todas as conotações abstratas e intelectuais com as quais ainda é estudada e interpretada hoje. Para Masaccio, a perspectiva é um meio, não um fim. Um meio prodigioso que abre espaços, os aprofunda e, simultaneamente, os circunscreve. Em suma, faz do espaço pictórico uma continuação do espaço real. Ele havia experimentado isso pela primeira vez no jovem Tríptico de San Giovenale, descoberto há quarenta anos e agora preservado na bela Abadia de San Pietro a Cascia, uma pequena vila a poucos quilômetros de Florença. Masaccio pintou os quatro santos nos painéis laterais com um fundo dourado. Mas, graças à perspectiva do piso, esse fundo dourado se torna um ambiente, um espaço dentro do qual as figuras se reúnem. Não é mais o contorno que embeleza e transporta os santos retratados para outro espaço, isto é, para outro mundo.

Mas há mais. A perspectiva permite que as cenas sejam despojadas até o osso. Permite que os babados, os enfeites, as distrações decorativas caiam como folhas secas e inúteis. Masaccio explora essas possibilidades ao máximo, porque sua arte procede da simplificação. Tudo deve ser claro, visível, inequívoco, desprovido de retórica. Em uma palavra, deve ser simples. Fácil de olhar e absorver no coração, assim como ele achava fácil pintar. Até Caravaggio, ao criar A Vocação de São Mateus na Capela Contarelli, em San Luigi de' Francesi, ele teria apreciado essa lição. A parede nua, cortada pela luz, ao fundo, é uma das passagens mais masaccianas da história da arte: algo assim não pode deixar de ser verdade.

Assim como a capela de Caravaggio dois séculos depois, também a capela Brancacci surpreendeu todos os seus contemporâneos. Vasari, em sua biografia de Masaccio, lista uma longa lista de artistas que vieram a Florença para observar e tentar compreender. Michelangelo também viria, copiando e desenhando algumas das figuras; Leonardo também passou por aqui, por natureza tão distante de Masaccio, mas nos deixou um registro de extraordinária perspicácia em seu diário. Ele escreve que a diferença entre aquele pintor "conhecido como Masaccio" e todos os outros, e evidentemente não apenas aqueles que o precederam, era que todos, comparados a ele, pareciam "trabalhar em vão".

Fonte: https://www.30giorni.it/

Quando a única opção que sobrou, foi aprender a confiar

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Cibele Battistini - Talita Rodrigues - publicado em 16/09/25

Existem momentos na vida em que todas as certezas parecem desmoronar. Aquelas bases que nos sustentavam, de repente, já não seguram mais o peso da nossa dor.

É como se a vida nos colocasse diante de um abismo e, ao olhar para frente, só houvesse escuridão. É nesses instantes – quando já não resta mais nada – que a única opção possível é aprender a confiar.

Confiar em Deus não é um exercício imediato nem automático. É um processo que envolve nossas fragilidades mais profundas, nossos medos mais silenciosos e as perguntas sem respostas que carregamos dentro de nós. A psicologia nos lembra que a alma humana busca segurança, previsibilidade, algo que a mente possa controlar. Mas a fé nos ensina que nem tudo pode ser explicado, e que existe uma dimensão da vida onde o controle precisa ser entregue.

Nas noites escuras da alma – aquelas em que as lágrimas parecem não ter fim e o silêncio de Deus pesa como um fardo – a confiança se torna uma escolha. Não porque sentimos que tudo ficará bem, mas porque acreditamos que mesmo no invisível, Ele permanece presente. É um abandono confiante que nasce da vulnerabilidade: quando não conseguimos caminhar sozinhos, deixamos que Deus seja o nosso sustento.

É justamente nesse ponto de rendição que muitas curas começam. Quando cessamos a luta interna de querer respostas imediatas, abrimos espaço para que a graça de Deus nos sustente no mistério. A confiança, então, não é apenas uma virtude espiritual, mas também um processo psicológico de aceitação: de compreender que a dor tem um tempo, que a travessia da noite exige paciência, e que mesmo quando tudo parece perdido, algo em nós ainda pode florescer.

A fé não elimina o sofrimento, mas dá sentido a ele. Confiar em Deus é se permitir ser conduzido no escuro, acreditando que há um amanhecer à frente, mesmo quando ainda não conseguimos enxergar a luz. É aprender que não estamos sozinhos na noite, porque Aquele que nos criou nunca abandona a sua obra.

Se hoje a sua vida se encontra em uma dessas noites escuras, lembre-se: a confiança não é ausência de medo, mas a decisão de caminhar mesmo com o coração tremendo. Talvez tudo o que lhe reste seja confiar. E, paradoxalmente, é justamente aí que a sua força será renovada.

Confiar é a entrega mais difícil e, ao mesmo tempo, o maior gesto de amor que podemos devolver a Deus. Porque, quando já não nos resta mais nada, descobrimos que Ele sempre foi o essencial.

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Fonte: https://pt.aleteia.org/2025/09/16/quando-a-unica-opcao-que-sobrou-foi-aprender-a-confiar/

Os surpreendentes alimentos que ajudam a dormir melhor (Parte 2/2)

Crédito:Serenity Strull/ BBC

Os surpreendentes alimentos que ajudam a dormir melhor

Author: Jessica Bradley

De BBC Future

26 agosto 2025

Qual o valor do magnésio?

O magnésio é outro nutriente encontrado em dietas ricas em plantas que pode levar a uma boa noite de sono. O mineral pode ajudar a reduzir os níveis de cortisol, o hormônio do estresse, o que acalma o sistema nervoso.

A recomendação é que a maioria dos adultos com mais de 30 anos consuma cerca de 420 mg de magnésio por dia. Ele pode ser encontrado em muitos alimentos, incluindo verduras como espinafre, além de legumes, nozes, sementes e grãos integrais.

A hora do dia em que você decide comer também desempenha papel importante na qualidade do sono (Crédito: Getty Images)

Mas muitas pessoas apresentam falta desse nutriente.

Especialistas afirmam que isso ocorre, em parte, devido à alimentação ocidental (com baixo teor de plantas e rica em alimentos ultraprocessados) e, por outra parte, porque as práticas de agricultura intensiva reduzem a quantidade de magnésio no solo para o cultivo agrícola.

No seu estudo de 2024, a professora de Ciências do Exercício Heather Hausenblas, da Universidade de Jacksonville, no Estado americano da Flórida, testou os efeitos do aumento da ingestão de magnésio para pessoas que se queixam de má qualidade do sono.

Por duas semanas, elas tomaram suplementos de magnésio uma hora antes de irem para a cama. E, durante outras duas semanas, elas tomaram um comprimido de placebo.

Seu sono foi avaliado por um rastreador usado no corpo e os participantes também relataram sua impressão sobre a qualidade do sono.

Hausenblas concluiu que a sono profundo e REM dos participantes melhorou quando eles tomaram magnésio, em comparação com o placebo. Ela suspeita que o efeito duraria mais do que duas semanas, mas não há como saber ao certo.

A professora afirma que suplementos de magnésio de boa qualidade podem ajudar as pessoas a dormir melhor. Mas Hausenblas ressalta que esta não é uma panaceia.

"Simplesmente tomar isso [suplementos de magnésio] antes de ir dormir não irá curar todos os seus problemas de sono se você não sair e se exercitar, se comer muitos alimentos ultraprocessados e se não tiver um ciclo estável de sono e vigília", afirma ela.

Outro motivo por que o magnésio pode melhorar o sono se deve aos seus possíveis benefícios à saúde mental. Pesquisas indicaram que a má qualidade do sono está intimamente relacionada à depressão, por exemplo.

Um estudo de 2017 concluiu que um suplemento diário de magnésio gerou melhoria significativa da depressão e da ansiedade, independentemente da idade, gênero ou gravidade da depressão de uma pessoa.

De forma mais ampla, pesquisas também indicam que uma alimentação rica em frutas e verduras pode melhorar os sintomas da depressão.

Como a nossa alimentação influencia?

Os pesquisadores concordam que o jantar cuidadosamente selecionado não é suficiente para nos salvar de uma noite de sono de má qualidade, mas podemos alterar o horário das nossas refeições ao longo do dia.

"Um dos pontos mais importantes antes do sono é deixar de comer algumas horas antes de irmos para a cama e, especialmente, não ingerir a maior porção de calorias [do dia] antes de dormir", explica Jansen.

Algumas pesquisas associam fazer as refeições mais cedo durante o dia, a começar pelo café da manhã, à melhor qualidade do sono. E pesquisas indicam que fazer a sua última refeição do dia mais perto da hora de dormir pode aumentar o tempo necessário para que você caia no sono.

Isso pode ocorrer, em parte, porque é mais fácil associar a alimentação com a luz do dia e a noite, com dormir, segundo Jansen.

"Quando você tem uma separação mais clara entre o dia e a noite, o cérebro tem mais facilidade para reconhecer que está na hora de dormir", explica ela. "O cérebro se reinicia toda manhã e a exposição à luz no início do dia é importante para acertar o relógio do nosso corpo."

Estudos indicam que suplementos de melatonina podem melhorar o sono, mas também podemos conseguir melatonina na alimentação (Crédito: Getty Images)

"A hora de comer é outra forma de dizer ao nosso corpo que horas são", segundo Erica Jansen. "O corpo sente que funciona melhor quando estamos fazendo as mesmas coisas no mesmo horário, todos os dias."

E, quando tomar o café da manhã, tenha em mente que um estudo concluiu que o café da manhã rico em laticínios à luz do dia pode ser mais benéfico para o sono do que em um cômodo com pouca iluminação. Os pesquisadores afirmam que comer à luz do dia permite que o nosso corpo produza mais melatonina, o hormônio que nos ajuda a dormir à noite.

Mas St-Onge ressalta que os cientistas ainda não produziram respostas definitivas sobre a influência ou não da melatonina obtida das plantas sobre a melatonina produzida pelo corpo — e como ela pode influenciar o nosso sono.

"Além disso, será que o nosso metabolismo é influenciado pelo que comemos?", questiona ela. "Isso poderá ser relevante para o sono. Precisamos nos aprofundar mais nestes mecanismos."

Jansen concorda que esta é uma área difícil para as pesquisas, com diversas questões ainda sem resposta. Uma delas é qual a quantidade de melatonina de que precisamos na alimentação para que ela tenha efeito sobre o nosso sono.

"É difícil estudar se a luz influencia mais a melatonina do que a alimentação ou se elas trabalham em conjunto", afirma ela.

Como otimizar a dieta para dormir bem

Aparentemente, a alimentação rica em vegetais é a mais benéfica para o nosso sono, por diversas razões. E comer em horários constantes ao longo do dia também pode ajudar, se você tiver condições para isso.

Mas a nossa alimentação não faz tudo sozinha. Os pesquisadores destacam que o sono também é influenciado pela nossa movimentação durante o dia, nossa saúde mental e nossa exposição à luz e ao escuro.

Marie-Pierre St-Onge também ressalta que é importante diferenciar entre o sono de má qualidade e os distúrbios do sono, como a insônia e a apneia do sono.

"Se você tiver um distúrbio do sono, você precisa ser examinado e tratado", orienta St-Onge. "Parte do plano de tratamento pode ser melhorar a alimentação, mas algumas pessoas precisarão de algo mais além disso."

Importante: todo o conteúdo desta reportagem é fornecido apenas como informação geral e não deverá ser tratado como substituto ao aconselhamento de um médico ou outro profissional de saúde. A BBC não é responsável por nenhum diagnóstico feito por um usuário com base no conteúdo deste site. A BBC não é responsável pelo conteúdo de nenhum site externo da internet relacionado, nem endossa nenhum produto ou serviço comercial mencionado ou anunciado em nenhum desses sites. Consulte sempre seu médico sobre qualquer preocupação com a sua saúde.

Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Innovation.

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/articles/cx29v8pwejjo

A encarnação de Cristo no tempo – esperança da eternidade

(©AFP/Alberto Pizzoli)  (AFP or licensors)

"Peregrinar na esperança, como o lema do Ano Jubilar nos propõe, é descobrir em cada momento do viver, uma perspectiva de eternidade. A eternidade é o impulso para viver com o coração aberto para a criatividade da existência".

Jackson Erpen - Cidade do Vaticano

A encarnação de Cristo no tempo revela o amor de Deus que se fez próximo da humanidade. O eterno entrou na história, assumindo a condição humana para redimir aquilo que estava perdido e reconciliar o homem com o Criador. Em Jesus, o Verbo que se fez carne, o infinito se manifesta no finito, e o divino se une ao humano sem confusão. Essa realidade mostra que a salvação não é apenas uma promessa distante, mas já se faz presente na caminhada terrena, dando sentido à existência e iluminando o tempo com a presença de Deus.

Contudo, a encarnação não se limita ao agora; ela abre a perspectiva da eternidade. Em Cristo, a humanidade encontra não só a redenção do presente, mas também a esperança da plenitude futura, quando o tempo dará lugar ao encontro definitivo com Deus. Aquele que entrou na história aponta para além dela, revelando que a vida não termina no limite do corpo, mas se prolonga na comunhão eterna com o Pai. Assim, a encarnação é sinal e garantia de que a eternidade já começou em Cristo, e de que cada instante vivido Nele é um passo em direção à vida plena que não terá fim.

Depois de “Jesus Cristo, a esperança da Igreja”, Pe. Gerson Schmidt* nos propõe hoje a reflexão “A encarnação de Cristo no tempo – esperança da eternidade": 

"Com a encarnação de Cristo, a eternidade entrou no tempo e criou-se assim a própria possibilidade da esperança, segundo Kierkegaard. Na “teologia da esperança” não seria a encarnação o fundamento da esperança, mas a ressurreição. Porém, Cristo não se encarna simplesmente para se encarnar, mas com um objetivo próprio e concreto, ou seja, para salvar a humanidade, para morrer e ressuscitar por amor a nós. Esses dois movimentos precisam ser mantidos juntos: a encarnação e a ressurreição. É o que nos aponta Raniero Cantalamessa: “As duas coisas devem ser mantidas juntas. Num ponto da história - a Encarnação - a humanidade entrou no tempo, em outro ponto da história - a ressurreição - o tempo entrou na eternidade! O horizonte cristão da eternidade - como mais genericamente da salvação - é possibilitado, conjuntamente, pela encarnação e ressurreição de Cristo. O Natal não é menos indispensável para a esperança cristã do que é a Páscoa. Outros homens morreram e ressuscitaram, segundo a Bíblia, mas não fundaram nenhuma esperança nova. Se isso aconteceu com Cristo é porque a sua não era a morte e ressurreição de uma pessoa qualquer, mas de um homem-Deus”[1].

Kierkegaard diz assim: “A Esperança do Cristianismo é a eternidade e Cristo é o caminho; o seu abaixamento (kênosis na teologia) é o caminho, mas também quando ascende ao céu, ele é o caminho”. Para o pensamento bíblico, o ser humano não é tanto o que é determinado a ser pelo seu nascimento, mas o que é também chamado a se tornar, mediante o exercício de sua liberdade, na obediência à Palavra de Deus. Uma esperança madura, segundo Kierkegaard, não oferece garantias, mas se mantém independente das circunstâncias e é um ato corajoso de aceitar a vida nas mãos de Deus, sem pedir segurança. A esperança, para Kierkegaard, é o fundamento da existência: a partir da crença na possibilidade do bem, surge um terreno fértil para a descoberta de si e para a afirmação da vida. Em Kierkegaard, o desenvolvimento da esperança autêntica deve deixar de ser marginal para se tornar algo essencial como ponto de partida para todo projeto de vida. O desespero, a falta de esperança, surge quando o indivíduo se recusa a ser uma criatura e busca a autonomia perfeita, ou quando não assume a responsabilidade pela sua própria existência. A esperança é como antídoto de desespero. A esperança, ao contrário, é um modo de pensar sobre a existência que pode superar o desespero, pois oferece uma base para a construção de uma vida autêntica. As pessoas entram em desespero por falta de perspectiva, possibilidade de solução, saída para seus problemas. Precisamos levar ao desesperado a palavra fundamental da esperança, da alegria do Evangelho, da vitória de Cristo sobre qualquer circunstância intransponível.

Deus nunca nos deixa sem uma possibilidade. A possibilidade nos arranca da mesmice, do desespero, da angústia do nada. O ser humano precisa de possibilidades. Elas são para ele como que o oxigênio. Sem elas, morre de asfixia espiritual. Kierkegaard diz assim: “A possibilidade é a única coisa que salva. Alguém desmaia, procura-se água de colônia ou gotas e Hoffmann; quando alguém quer desesperar, deve-se dizer: ‘rápido encontre-lhe uma possibilidade, deem-lhe uma possibilidade. É o único remédio deem-lhe uma possibilidade e o desesperado recupera ânimo, e anima-se porque se o homem fica sem possibilidade é como seguir faltando-lhe o ar”[2].

Cantalamessa, em seu livro, “Fé, esperança e caridade – as três graças do Cristianismo”, editado no Brasil pela Editora Paulus, apresenta um subtítulo “Deem-lhe uma oportunidade”. Pois só a eternidade remove todos os obstáculos que se interpõem à esperança, até o último obstáculo que é a morte. A esperança não se torna simplesmente uma virtude dos mais jovens. A virtude da esperança é uma virtude para toda a vida, sobretudo para o tempo da velhice. Sempre é tempo de esperar, não passivamente, mas de forma criativa e inovadora. Quem não espera mais em nada, já é um morto-vivo. Não terá motivação, não terá alegria, não verá oportunidade diante dos desafios. Estará sempre olhando para a realidade nua e crua, sem descoberta de um porvir. Peregrinar na esperança, como o lema do Ano Jubilar nos propõe, é descobrir em cada momento do viver, uma perspectiva de eternidade. A eternidade é o impulso para viver com o coração aberto para a criatividade da existência".

*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
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[1] CANTALAMESSA, RANIERO. “Fé, esperança e caridade – as três graças do Cristianismo”, Ed. Paulus, 2024, p. 104.
[2] Idem, 106.

Fonte: https://www.vaticannews.va/pt

Pe. Manuel Pérez Candela

Pe. Manuel Pérez Candela
Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Imaculada Conceição - Sobradinho/DF